Comércio Exterior com Cara Nova: Uma Oportunidade para o Brasil

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Uma mudança de visão sobre internacionalização tende a trazer retornos econômicos

Rodrigo Solano (*)

Através uma simples busca sobre o significado de “Comércio Internacional” no Wikipedia, um dos meios mais relevantes para se obter informação para gerações do século XXI, podemos notar uma sutil mas importante diferença entre a definição do termo em português e sua versão em inglês. Existe, é claro, um debate sobre a confiabilidade da fonte, mas ela é significativamente utilizada pela atual sociedade em rede, cuja cultura interage com plataformas e meios digitais, e é suficiente para instigar uma reflexão sobre a diferença entre as versões e a realidade do comércio exterior brasileiro, com destaque para as exportações.

Enquanto na definição em português, o comércio internacional está ligado à “troca de bens e serviços através de fronteiras internacionais ou territórios”, em inglês, são contemplados os termos “necessidade e desejo” por bens e serviços, o que não é uma novidade. O desejo por produtos diferentes constituiu o motor propulsor de diversos acontecimentos históricos que mudaram a configuração das relações humanas.

Um exemplo que nos coloca como parte do protagonismo global foi a formação do Império Português, frequentemente citado como o primeiro de alcance global. O contato etnocultural, configurado por relações interculturais tanto de conflitos como de intercâmbio de conhecimento e produtos, fez com que itens “desejados” na Europa circulassem por quase toda a esfera de influência lusitana. E isso fez com que uma grande variedade de produtos de regiões distantes viesse parar no Brasil. Exemplos são vários, mas pode-se citar o café, a cana de açúcar e a laranja, elementos até hoje com importante relevância para as exportações Brasileiras.

Coincidência ou não, a definição em português da enciclopédia online tem certa similitude com a pauta das exportações brasileiras. A partir das estatísticas do TradeMap do International Trade Center, as exportações do Brasil em 2021 tiveram a participação de 1,3% das exportações mundiais. Esse percentual varia ano a ano, mas raramente as metodologias de análise vão apontar uma participação que ultrapasse os 2%. Com base nos dados mais atuais da organização, em percentuais aproximados, a China tem 15%, a Alemanha 7,5% e os Emirados Árabes Unidos 2%, país com uma população 20 vezes menor que a do Brasil e território de clima árido 100 vezes inferior.

De acordo com o documento “Resultados da Balança Comercial Brasileira de 2022” publicado pelo governo federal, os itens mais exportados são commodities como: minério de ferro, petróleo (majoritariamente bruto) e diversos produtos agrícolas que, somados, chegam a cerca de 50% da pauta. São produtos que cruzam fronteiras, mas não interagem com o desejo de compra como estratégia comercial. Bens de consumo não aparecem no gráfico das exportações no documento, embora o país também exporte produtos de alto valor agregado, como maquinários e aeronaves.

Países como China e Alemanha possuem produtos como máquinas e equipamentos e veículos como destaque. E, entre os 25 produtos mais exportados (HC4), já aparecem bens de consumo como destaque em suas pautas de exportações. Além desses países, embora os Emirados Árabes Unidos tenham como principal produto de exportação o petróleo, na lista dos 25 mais exportados já aparecem calçados, têxteis, perfumes e até móveis. Há algumas décadas, esses bens de consumo eram inexistentes ou inexpressivos tanto para a indústria quanto para o comércio do país.

Hoje, o país árabe se destaca como um caso bem-sucedido de desenvolvimento de branding internacional, conseguindo se distanciar de potenciais percepções negativas acerca de regiões situadas nas proximidades do país, logrando chamar a atenção de turistas e compradores internacionais.

Vale mencionar que mercados desenvolvidos frequentemente internacionalizam seus negócios com o estabelecimento de unidades produtoras em território estrangeiro. Os produtos das chamadas multinacionais que fabricam in loco, não aparecem na pauta de exportações dos países em que nasceram, mas colocam suas marcas em plena interação com os consumidores espalhados pelo mundo, incluindo o Brasil. Assim mesmo, com diversas empresas de matriz estrangeira em solo nacional, as importações brasileiras de bens de consumo chegam a 10% do total.

Outra observação importante, a título de exemplificação, de acordo com o The World Economic Forum, o Brasil possui aproximadamente 40% da produção mundial de café, liderando o ranking dos 10 países apresentados. Já quando tratamos de exportações, a participação brasileira cai para aproximadamente 10% com base no TradeMap e, a Alemanha, que não aparece nas estatísticas como produtora no ranqueamento, é responsável por 6% das exportações de café, aparecendo como o 4º maior exportador mundial de café.

Entre os fatores que contribuem para esse alcance, estão o processamento do produto e a criação de significados que visam despertar desejo de compra através de uma estratégia de marketing ou branding internacional frequentemente presentes em embalagens e outros elementos de comunicação. Grosso modo, a Alemanha importa a commodity, agrega capital simbólico, e tem um maior faturamento através da comunicação com o mercado consumidor. Outrossim, entidades de classe do setor e a atuação da ApexBrasil tem investido para agregar valor ao café brasileiro, logrando progressivamente resultados positivos.

Obviamente, os exemplos aqui citados são insuficientes para que se chegue a uma conclusão que sirva de base para a estruturação de um planejamento estratégico que coloque o marketing internacional em relevo, aumentando assim a participação de bens de consumo industrializados na pauta de exportações brasileiras, para diversos produtos com potencial. Mas a grande quantidade de estudos, literaturas e artigos acadêmicos produzidos acerca do tema, além do eficiente arsenal de mecanismos de monitoramento da economia e comércio exterior do Brasil, podem dar o embasamento necessário para o desenvolvimento e execução de estratégias eficazes.

Em uma pesquisa que desenvolvi na Fundação Cásper Líbero (livre acesso), diversas marcas, sobretudo internacionais, utilizam elementos relacionados ao Brasil para a formulação de sua comunicação como estratégia de marketing nos maiores hipermercados espalhados pelo mundo, expostos em suas plataformas digitais, tendo como base a seleção produzida pela Delloite.

É provável que a grande participação de commodities em nossa pauta de exportação tenha configurado nossa forma de planejar o comércio internacional com base na simples troca de bens, o que implicaria a ênfase em preços e operações. Já em países, a exemplo dos E.U.A., em que o marketing é geralmente bastante valorizado, o foco das empresas em interagir com o desejo de compra está em consonância com a definição de comércio internacional em inglês encontrada na Wikipedia.

Através do planejamento com base na análise do que seria desejável no ambiente mercadológico internacional, seria possível incluir valor agregado na pauta das exportações brasileiras, com potenciais impactos econômicos sustentáveis. Além de produzir com excelência, o país poderia também agregar valor simbólico aumentando sua participação no comércio internacional mundial.

Ademais, um universo de compradores que interagem cada vez mais em redes, com forte circulação de imagens nas plataformas digitais, faz um convite para que o país apresente ao mundo uma Nova Cara, para a qual, pelo que tudo indica, já temos elementos necessários. Ousaria dizer que o próximo passo seria trabalharmos nossa estratégia de marketing e comunicação internacional de maneira interdisciplinar e integrada. Já os retornos econômicos tendem a ser uma consequência natural.

(*) Rodrigo Solano  – Professor e Especialista em Comunicação e Marketing Internacional

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