O ministro Alckmin demonstrou surpresa ao tomar conhecimento da dependência estrutural brasileira da poliamida 6 importada. Foto: Divulgação

Indústria têxtil surpreende VP Alckmin ao revelar dependência alarmante de fio importado e risco à produção nacional

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Encontro com vice-presidente expõe desconhecimento sobre a dependência da poliamida 6 e reforça urgência em calibrar medidas de defesa comercial. 94,49% de todo o volume consumido no país depende do mercado externo

Da Redação (*)

Brasília – O setor têxtil brasileiro acendeu um sinal de alerta diante de um possível desequilíbrio no fornecimento de filamentos sintéticos, especialmente a poliamida 6 (PA6), insumo fundamental para malharias e confecções. Dados do Relatório Setorial Brasil Têxtil 2025, elaborado pela IEMI – Inteligência de Mercado, mostram que o país registrou um déficit de US$885 milhões na balança comercial de filamentos sintéticos em 2024. As exportações somaram apenas US$54,8 milhões, enquanto as importações alcançaram US$939,9 milhões, o que significa que 94,49% do volume consumido é abastecido por produtos estrangeiros.

A diretora executiva da Abrafas, Ana Paula Jardim Ciuffa Pustiglione, destacou recentemente que a medida antidumping provisória aplicada ao fio de poliamida 6 representa um passo importante para restabelecer a concorrência justa. No entanto, empresários afirmam que o quadro é mais complexo: o Brasil não produz o insumo em volume suficiente, e qualquer barreira adicional à importação pode comprometer imediatamente as linhas de produção.

“A aplicação de sobretaxas em um insumo sem equivalente nacional representa um grande risco para nossa produção. Além de elevar os custos, isso pode comprometer a nossa capacidade de entrega e até mesmo o abastecimento do mercado”, afirma Daniel Pereira de Souza, vice-presidente da CPS – Cia. de Produção Sustentável S.A (DelRio).

Encontro em Brasília expõe desalinhamento

A tensão aumentou após uma reunião em 5 de novembro, quando mais de 20 empresários do setor têxtil, representando oito estados e mais de 500 mil trabalhadores que, acompanhados pelos senadores Cid Gomes e Esperidião Amin, estiveram com o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, em Brasília. Segundo participantes, o ministro demonstrou surpresa ao tomar conhecimento da dependência estrutural brasileira da poliamida 6 importada justamente no momento em que o governo aplica medidas de defesa comercial ao produto.

O episódio foi interpretado pelo setor como sinal de desalinhamento entre política comercial e realidade industrial. “A indústria nacional não tem capacidade para atender à demanda das malharias e confecções brasileiras, que, mesmo antes da aplicação da medida de dumping, já estavam com cargas de fio em trânsito marítimo para manter suas linhas de produção ativas. Qualquer barreira adicional à importação pode comprometer o abastecimento imediato, afetar empregos e pressionar preços ao consumidor final”, afirma Renato José Benvenuti, vice-presidente da RVB Malhas, de Brusque (SC).

Santa Catarina, líder nacional, teme impacto direto

Santa Catarina é o estado mais vulnerável a uma eventual ruptura no fornecimento. A indústria catarinense de confecções é a maior do país, segundo a FIESC, e o setor têxtil e de vestuário é responsável por 178,7 mil empregos formais, o maior contingente industrial do estado. Sem um fluxo contínuo de PA6, pequenas e médias confecções seriam as primeiras a sentir o impacto, comprometendo desde a manutenção de empregos até o abastecimento do varejo.

“Nós, empresários, entendemos que qualquer decisão deve preservar a continuidade das operações, o emprego e a competitividade de um dos setores que mais geram renda e oportunidades. Trata-se do futuro da indústria nacional, da manutenção de milhares de empregos e do fortalecimento da cadeia produtiva que sustenta inovação, renda e desenvolvimento regional. Avaliar com equilíbrio e responsabilidade o papel da poliamida 6 na economia brasileira é essencial para que o país continue competitivo, sustentável e capaz de inovar”, defende Gabriel Sens, CEO da LIVE!, empresa de Jaraguá do Sul (SC)

Setor pede calibragem das medidas de defesa comercial

Embora a medida antidumping ainda seja provisória e siga em debate técnico, representantes da cadeia produtiva defendem que a política comercial leve em conta a dependência externa do insumo. Segundo eles, o foco deve ser proteger a produção nacional sem provocar um desabastecimento súbito de um fio que o Brasil não fabrica em volume suficiente.

O pleito principal é pela calibragem das medidas, de forma que a busca por concorrência justa não comprometa milhares de empresas cuja sobrevivência depende de um abastecimento estável.

Para o setor, o desafio atual é equilibrar a política de defesa comercial com a necessidade de garantir continuidade produtiva em um mercado onde a dependência de importações é estrutural e amplamente conhecida pelos empresários, mas agora exposta também como um tema que exige maior alinhamento entre governo, indústria e cadeia têxtil nacional.

(*) Com informações da Abrafas

 

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