País passa a ser visto como uma alternativa viável para empresas que buscam reduzir sua exposição aos riscos da disputa entre as potências.
Bruno Giacometti (*)
Nas últimas semanas, Donald Trump distribuiu o aumento de tarifas para diversos países e, com a China, a guerra do tarifaço ainda perdura. A decisão ocorre em meio a uma tentativa do governo norte-americano de proteger sua indústria local e reduzir a dependência de cadeias produtivas externas, mas esse redesenho das trocas globais pode trazer efeitos indiretos e positivos para o Brasil, especialmente no médio e longo prazos.
Com a reconfiguração do comércio mundial, o Brasil passa a ser visto como uma alternativa viável para empresas que buscam reduzir sua exposição aos riscos da disputa entre as potências. Nossa relativa estabilidade institucional, a localização geográfica privilegiada, a abundância de recursos naturais e o tamanho do mercado interno são vantagens competitivas inegáveis, e, cada vez mais, reconhecidas globalmente.
Marcas chinesas, por exemplo, já vêm acelerando sua presença na América Latina, e o Brasil é peça-chave nessa expansão. Em 2023, os investimentos chineses no país cresceram 33% em relação ao ano anterior, totalizando US$ 1,73 bilhão, maior participação desde 2007, segundo relatório do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC). Esse movimento reforça o interesse internacional no Brasil como plataforma de crescimento e inovação.
Podemos oferecer condições atrativas para operações industriais, centros de distribuição e projetos de crescimento regional, desde que saibamos aproveitar essa onda com inteligência estratégica. O país pode, sim, se tornar uma ponte entre o Oriente e os mercados latino-americanos, um hub logístico e tecnológico, mas precisa agir com agilidade, visão de longo prazo e coordenação entre setores público e privado.
Esse possível movimento de realocação de investimentos internacionais tem o potencial de influenciar diretamente o câmbio. A entrada de capital estrangeiro, voltada à produção local, tende a fortalecer o real e aliviar pressões inflacionárias sobre produtos importados. No entanto, uma moeda mais valorizada também pode gerar efeitos colaterais indesejados, como o encarecimento das exportações, especialmente em setores com menor competitividade internacional. Há, portanto, ganhos relevantes, mas também riscos que exigem gestão atenta.
A balança comercial brasileira também pode passar por transformações significativas. Se por um lado aumentam as oportunidades de exportação de produtos com maior valor agregado, por outro, as importações de componentes asiáticos podem crescer à medida que cadeias de fornecimento globais forem reorganizadas. Nesse cenário, torna-se essencial promover a diversificação de fornecedores, estimular a inovação local e ampliar a integração da indústria nacional a cadeias globais mais sofisticadas.
As mudanças geopolíticas tendem a gerar impactos também no varejo. Com marcas internacionais buscando alternativas a mercados mais fechados como o norte-americano, o Brasil tende a se beneficiar da chegada de novas opções de bens e serviços. Isso estimula a concorrência, amplia a oferta e beneficia diretamente o consumidor brasileiro. O país também tem espaço para se consolidar como um polo regional de lançamentos e testes de novos produtos, reforçando sua importância no mapa global do consumo.
Ademais, o aumento de e-commerces internacionais e o desenvolvimento logístico no país, posiciona o varejo brasileiro como um mercado estratégico para empresas que buscam escala e capilaridade na América Latina
Porém, se quisermos, de fato, aproveitar essa janela de oportunidade, será necessário mais do que boas intenções. O Brasil precisa se posicionar com clareza, mantendo sua neutralidade diplomática, mas fortalecendo sua base produtiva, investindo em capital humano e promovendo acordos comerciais que garantam previsibilidade e competitividade. O mundo está mudando, e quem souber ler os sinais agora poderá colher frutos valiosos no futuro próximo.
(*) Bruno Giacometti, Diretor de Produtos na Allied Tecnologia.