João Dornellas - Presidente Executivo da ABIA

Exportações de alimentos industrializados recuam em agosto afetadas pelo tarifaço americano

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 China sustenta alta, EUA sofrem impacto da tarifa de 50% e México ganha destaque na pauta exportadora

Setor mantém desempenho geral positivo no acumulado até julho, com crescimento da produção e de empregos, apesar da pressão de custos e das novas barreiras comerciais

Da Redação (*)

Brasília – As exportações brasileiras de alimentos industrializados somaram US$ 5,9 bilhões em agosto, queda de 4,8% em relação a julho (US$ 6,2 bilhões) e de 1% frente a agosto de 2024. O desempenho contrasta com o pico registrado em julho, impulsionado pela antecipação de embarques aos Estados Unidos antes da entrada em vigor da tarifa adicional de 50%. Já a China consolidou sua liderança como principal destino em agosto, com US$ 1,32 bilhão, alta de 10,9% em relação a julho e expressivos 51% frente a agosto de 2024. Os dados fazem parte da pesquisa conjuntural realizada pela Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (ABIA).

“O desempenho das exportações nos dois últimos meses evidencia uma inflexão clara: o crescimento expressivo de julho foi seguido por ajuste em agosto, sobretudo nos EUA, impactados pela nova tarifa, enquanto a China reforçou seu papel como mercado âncora”, analisa João Dornellas, presidente executivo da ABIA.

Em julho, os EUA haviam importado US$ 460,1 milhões em alimentos industrializados do Brasil, alta de 26,2% frente a julho de 2024, com destaque para suco de laranja, proteínas animais e óleos e gorduras. Em agosto, já sob efeito da tarifa de 50%, os embarques recuaram para US$ 332,7 milhões (-27,7% em relação a julho e -19,9% na comparação anual), reduzindo a participação americana no total exportado pelo setor de 7,4% para 7% do total.

Queda ante mercado americano mostra necessidade de diversificação

“O resultado das exportações para os EUA em agosto reforça a necessidade de diversificação de mercados e da manutenção ativa das negociações, com o objetivo de não apenas mitigar impactos conjunturais, mas também assegurar condições mais previsíveis e competitivas de acesso ao mercado norte-americano”, afirma Dornellas.

A análise dos produtos mais afetados mostra que a medida atingiu diretamente segmentos centrais da pauta de exportações de alimentos para os EUA. A queda mais acentuada foi registrada nos açúcares (-82,3% em relação a agosto de 2024 e -69,5% ante julho), praticamente anulando as vendas no período. Proteínas animais, segundo item mais relevante, também sofreram forte queda (-43,3% na comparação anual e -45,8% ante julho), refletindo perda de competitividade diante do novo custo de acesso ao mercado norte-americano. Preparações alimentícias também recuaram (-37,5% em relação a julho), embora tenham apresentado alta interanual de +13,5%, sinalizando volatilidade.

Duas exceções merecem destaque. O suco de laranja, que ficou fora da sobretaxa de 50%, caiu -11% frente a julho, mas cresceu 6,8% em relação a agosto de 2024. A queda mensal não está associada à tarifa, mas sim à antecipação dos embarques em julho, quando exportadores buscaram se adiantar à medida. Já o grupo de óleos e gorduras mostrou resiliência, com alta de 30% na comparação anual e avanço de 1,8% ante julho, atenuando em parte o recuo dos demais segmentos.

A ABIA estima que as vendas de alimentos atingidos pelo tarifaço para o mercado norte-americano podem cair até 80% entre agosto e dezembro, o que representaria uma perda de US$ 1,351 bilhão. “Essa premissa considera que a elevação tarifária recai sobre produtos com alta sensibilidade ao preço final, baixa margem de absorção de custos e forte concorrência internacional “, diz Dornellas.

“A relação comercial Brasil–Estados Unidos no setor de alimentos é sustentada por cadeias produtivas integradas e benefícios mútuos. Preservá-la e aprofundá-la, por meio de um diálogo equilibrado e permanente, é fundamental para garantir empregos, renda e segurança alimentar em ambos os países”, destaca o dirigente da ABIA.

Exportações gerais têm queda, mas sobem para a China e México é destaque

De janeiro a julho de 2025, as exportações gerais totalizaram US$ 36,44 bilhões, representando uma queda de -0,3%, em valor, em relação aos US$ 36,57 bilhões no mesmo período de 2024 e de -7,7%, em volume, influenciada principalmente pela menor disponibilidade de açúcar durante a entressafra.

A China consolidou sua liderança como principal destino em agosto, com US$ 1,32 bilhão, alta de 10,9% em relação a julho e expressivos 51% frente a agosto de 2024. A participação chinesa chegou a 22,4% do total exportado, puxada por proteínas animais (US$ 909,7 milhões, +67,0%) e açúcares (US$ 326,7 milhões, +20,2%).

Os países da Liga Árabe compraram US$ 838,4 milhões em agosto, queda de -5,2% sobre julho último e alta de 14,2% sobre o mesmo mês do ano passado e participação de 14,2%. Já as vendas para a União Europeia alcançaram US$ 657 milhões, com redução de 14,8% sobre julho e de 24,6% ante agosto de 2024.

O México ganhou destaque na pauta exportadora em agosto, com embarques somando US$ 221,15 milhões (3,8% do total). O aumento foi impulsionado por proteínas animais (US$ 204,15 milhões, +368,5% sobre agosto de 2024) e, em menor medida, por preparações alimentícias diversas.

“O avanço do México, que coincide com a retração das vendas aos Estados Unidos, indica um possível redirecionamento de fluxos e a abertura de novas rotas comerciais, movimento que ainda requer monitoramento para identificar se terá caráter estrutural ou apenas conjuntural”, detalha o presidente da entidade.

A ABIA projeta que as exportações gerais do setor (considerando todos os países compradores) podem cair, no pior cenário, 4,5% entre agosto e dezembro e as exportações anuais, -2%. A previsão de queda no faturamento da indústria de alimentos, entre agosto e dezembro, é de -1,1%, enquanto o faturamento anual da indústria deve ter um recuo de -0,6%.

Faturamento e vendas do setor mostram crescimento

Mesmo em um cenário de desaceleração da economia, a indústria brasileira de alimentos mostrou desempenho positivo nos sete primeiros meses de 2025. O faturamento alcançou R$ 780 bilhões, o que representa uma alta nominal de 10,2% em relação ao mesmo período do ano anterior. Já as vendas reais (deflacionadas) cresceram 2,8%, enquanto a produção física avançou 2%.

O desempenho do setor contrasta com o resultado geral da economia brasileira. No primeiro semestre, o PIB do país cresceu 1,8% em relação ao mesmo período de 2024, mas com desaceleração no ritmo de crescimento no segundo trimestre: após alta de 1,4% nos três primeiros meses, houve um avanço de apenas 0,4% entre abril e junho. “Apesar desse cenário geral, a indústria de alimentos seguiu em expansão, sustentada pelo dinamismo do mercado interno, pela geração de empregos e por uma forte base exportadora”, explica o presidente da ABIA.

As vendas no mercado interno responderam por 72% do total, com crescimento nominal de 9,3% e real de 1,9% (deflacionado pelo grupo alimentos e bebidas do IPCA-IBGE). “Esses resultados estão alinhados à evolução do emprego e da renda da população brasileira. A dinâmica da atividade econômica no primeiro semestre, mesmo em um contexto de desaceleração do ritmo de crescimento, impulsionou o dinamismo do mercado de trabalho e contribuiu para sustentar o consumo de alimentos”, ressalta Dornellas.

As receitas de exportação mostraram recuperação da queda observada nos primeiros meses do ano, alcançando US$ 36,4 bilhões (-0,3%). Apesar da melhora, a base em volume ainda está abaixo da observada no mesmo período de 2024, com redução de -7,7%, influenciada, principalmente, pelo desempenho do açúcar em período de entressafra, até abril, e baixos estoques do produto. Em moeda nacional, a receita apresentou alta estimada de 13,2%.

Os resultados aferidos até agosto de 2025 evidenciam que as exportações, responsáveis por cerca de 28% das vendas da indústria de alimentos, constituem um eixo importante para o setor e para a economia nacional. Além de impulsionar a produção e agregar valor às cadeias produtivas, elas estimulam novos ciclos de investimento de longo prazo e fortalecem a inserção do país no mercado global de alimentos, altamente competitivo e regulado.

(*) Com informações da ABIA

 

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