Por Lilian Carvalho (*)
O recente layoff no Itaú repercutiu de forma intensa nas redes sociais, com mais de 2.263 menções e cerca de 1.970 autores únicos discutindo o tema. Desde o anúncio da demissão de mais de mil funcionários, o banco, em justificativa oficial, diz que foi a “baixa produtividade” detectada pelo monitoramento digital dos funcionários em home office e, segundo relatos, com base em registros de inatividade ou pouca atividade nos computadores ao longo de meses.
O Itaú alegou avaliar diversos aspectos do trabalho, alinhamento cultural e padrões de confiança como partes centrais da decisão, sem mencionar, contudo, o número exato de demitidos. Nas redes sociais, a repercussão foi majoritariamente negativa, destaca-se que 23% dessas manifestações expressam tristeza, e a palavra mais citada ao lado de “layoff” foi “home office”, já que a justificativa central do banco relacionou as demissões à suposta baixa atividade nos computadores dos funcionários, deixando em segundo plano critérios de entrega ou performance efetiva. O post mais viral sobre o tema traz uma tirinha irônica, expondo o estranhamento coletivo diante de um modelo de controle que remete à era da administração científica de Taylor e Fayol, focada em tempos e movimentos, mesmo em pleno século XXI.
Na transição para a era digital, bancos como o Itaú investem fortemente em tecnologia e modernização, colhendo lucros recordes (superiores a R$ 22 bilhões no semestre), mas optam por mecanismos de monitoramento que contrastam com narrativas de inovação e empoderamento do trabalhador.
O argumento de “baixa produtividade” foi operacionalizado por meio da análise de cliques, abas abertas, tarefas lançadas no sistema e outras métricas digitais, reiterando um tipo de vigilância reminiscente das fábricas da Revolução Industrial. Para muitos, trata-se de uma contradição: o trabalho remoto deveria ser avaliado a partir de entregas, criatividade, autonomia e resolução de problemas, não pelo registro exato de interações no computador.
A repercussão negativa é alimentada não só pelo impacto nas vidas dos demitidos, mas também pelo debate ético e jurídico que se coloca no Brasil contemporâneo: até onde pode ir o controle empresarial sobre o tempo do trabalhador em casa?
O monitoramento não pode invadir a esfera privada. Deve resguardar direitos previstos na CLT, seguir limites da LGPD e respeitar a dignidade do trabalho remoto. Quando o banco adota políticas de vigilância baseadas somente em login, tempo de tela ou uso de aplicativos e passa a ignorar entregas, soft skills e contexto, reencena, com roupagem algorítmica, velhos paradigmas fordistas.
Esse caso, portanto, reacende a pergunta fundamental: no século XXI, faz sentido adotar métodos tayloristas de monitoramento digital em ambientes criativos, baseados em conhecimento e autonomia? A resposta, ecoada pelas redes sociais, é que entregas e resultados deveriam se sobrepor à métrica dos “tempos e movimentos” agora traduzidos em cliques e logs ao invés de cronômetros e folhas de tarefas. A cultura algorítmica, ao ignorar resultado concreto e contextos de trabalho, arrisca reproduzir um controle puramente burocrático, deixando de lado o resultado, financeiro e operacional.
A repercussão do layoff no Itaú não deixa dúvida: é hora de superarmos as sombras da administração fordista e buscarmos modelos realmente compatíveis com a transformação digital e humana do trabalho.
(*) Lilian Carvalho, PhD em Marketing e coordenadora do Centro de Estudos em Marketing Digital da FGV/EAESP e fundadora da Método Lumière.