Não é difícil percebermos que as produções cinematográficas e musicais, a exemplo das norte-americanas, apresentam lugares, produtos e marcas. E uma vez que essas coisas chegam aos nossos sentidos causando uma boa impressão, nosso desejo de consumo aumenta. E as exportações dos países que promovem arte, também!
Rodrigo Solano (*)
Minha formação e primeiras especializações sempre estiveram ligadas à administração, comércio e marketing internacionais. Nessas disciplinas aprendemos técnicas e ferramentas para promoção comercial, negociação e comunicação de modo que impulsione as vendas. Mais tarde vim me especializar em Semiótica Psicanalítica (Clínica da Cultura) e concluí um mestrado em comunicação. Trabalhei muitos temas, mas o que interessa aqui ficou gravado, a cultura influencia no que desejamos. Simplificando: se queremos vender, é importante que nossos produtos e serviços participem positivamente do universo cultural de quem consome.
Embora tanto as disciplinas ligadas à administração quanto as ciências sociais demonstrem a ligação entre cultura e consumo, mesmo que de formas diferentes, no Brasil parecemos tender a acreditar que o que aprendemos é uma coisa, e a prática é outra. Isso nos distancia do que deveria ter sido assimilado e aplicado e coloca a palavra “cultura” num lugar alienado do mundo corporativo brasileiro. Isso sem falar em arte.
E esse não deveria ser um assunto novo. A Cachaça 51, por exemplo, interagiu com um seriado norte americano como estratégia para impulsionar vendas internacionais, conforme noticiado pelo G1 em 2015 “Ação de marketing coloca cachaça 51 no seriado ‘Two and a half men’”.
Relacionar Economia Criativa, Turismo e Exportações é algo que costumo fazer meu trabalho, sempre que possível e viável. Contudo, para uma abordagem que seja mais contributiva, entrevistei Cristiano Braga, um profissional que, com muitos anos de experiência, navega com excelência nos temas: exportações, economia criativa, incluindo artes e turismo. Atualmente é Supervisor de Economia Criativa na Gerência de Experiências e Competitividade Internacional na Embratur. Sua objetividade e fluência nas respostas dispensam que eu discorra mais sobre o assunto e coloque o conteúdo na íntegra.
Os EUA são um exemplo de país que através de sua produção artística, especialmente cinematográfica, estimulam o consumo internacional de seu estilo de vida, suas marcas e produtos. Você acredita que o Brasil poderia seguir um caminho semelhante?
O Brasil tem sim potencial para fortalecer seu soft power através da Cultura. Essa, de certa forma, exerce influência sobre a imagem do Brasil de forma positiva. O que falta é uma concertação de país, a exemplo do que fez a Coreia do Sul nos anos 90 onde o setor público e o privado se uniram para promover, através da cultura e Indústrias Criativas, daquele país. Hoje se escuta música e se assiste a séries coreanas no mundo todo. A Coreia colhe frutos exportando serviços, licenciando conteúdos e sendo positivamente percebida mundo afora.
Quais os principais desafios para que o setor turístico e os exportadores enxerguem o potencial da arte?
Olha, são muitos desafios. Creio que o turismo tem na cultura um ativo que agrega valor a essa atividade, o que precisa é qualificar o empreendedor e nos promovermos nos mercados corretos, esforço esse que a Embratur vem tentando acertar com inteligência de dados, articulação com diversos parceiros e ações ousadas nos mercados.
A grande participação de commodities na pauta exportadora pode ser um fator limitante para organizações enxergarem o potencial da arte como propulsora de exportações?
Não há espaço para tudo. O que o Brasil precisa, no caso das artes, é criar as condições internas, no ambiente interno, continuar as ações de promoção, como os projetos ApexBrasil, e construir uma política de país para inserção da sua produção criativa com os diferentes atores públicos e privados. Num país continental e com muitas carências essa não é uma tarefa fácil, mas precisa se começar e ter continuidade, aspecto crítico no Brasil.
Que oportunidades e iniciativas existem e que segmentos podem melhor se beneficiar?
O Brasil tem potencial no audiovisual, no segmento de games sobretudo, na música e nas artes contemporâneas. São segmentos mais expostos aos mercados lá fora, com seus agentes circulando em eventos e feiras internacionais já há bastante tempo. A despeito da falta de continuidade das políticas e da falta de um projeto de país que favoreça a circulação das nossas artes e da nossa produção criativa
Através das respostas de Braga, fica nítido o despertar de um pensamento maduro no Brasil, a exemplo das atividades da Embratur e da ApexBrasil. Todavia, a consciência da importância da economia criativa como promotora de exportações e turismo deve fazer parte de projetos e políticas públicas que ultrapassem governos, o que ainda não acontece como no exemplo da Coreia do Sul. Neste ínterim, empresas nos setores de turismo e exportadoras, que atentem para a oportunidade, podem sair na frente. E que se preparem para a possibilidade de atenderem a um número bem maior de clientes internacionais!
(*) Rodrigo Solano, Especialista em Internacionalização e Relações Interculturais
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