Jorge Viana, presidente da ApexBrasil. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

“Temos que mirar US$ 1 trilhão no comércio exterior, essa é a nossa meta”, diz presidente da ApexBrasil

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Brasília -O governo brasileiro segue mirando a marca de US$ 1 trilhão em seu comércio exterior (exportações+importações) e “na busca desse objetivo tem promovido relações comerciais com todos os mercados que são estratégicos para o país. Alcançar esse US$ 1 trilhão não é só uma marca histórica. Significa gerar mais emprego, renda, aumento da presença das empresas brasileiras no mundo”. A afirmação foi feita pelo presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), Jorge Viana, em entrevista por e-mail ao Comexdobrasil.com.

Jorge Viana destacou que “o Brasil voltou a ser protagonista no cenário internacional no governo Lula”, mencionou as ações e projetos inovadores implementados pela Agência (como o Exporta Mais Brasil, Mulheres e Negócios Internacionais, a criativa Plataforma Brasil Exportação, ações de inclusão das PMEs da Amazônia e do Nordeste no comércio exterior, o Exporta Mais Amazônia e muitos outros).

Diplomático, o presidente da ApexBrasil negou a existência de uma competição desleal da China no mercado brasileiro envolvendo, sobretudo, as exportações de carros elétricos e calçados. Segundo ele, “é preciso entender que cada país procura defender seus próprios interesses. Claro que abusos não são tolerados e a diplomacia e o direito internacional existem para equilibrar esse jogo. Mas não é uma guerra. O comércio entre Brasil e China atingiu o patamar histórico de US$ 157,5 bilhões em 2023 e tem potencial para crescer muito mais”.

Para enfrentar a concorrência chinesa, Jorge Viana afirmou que “temos que ser mais competentes, exportar mais e melhor, vencer a concorrência entrando em mais mercados, com mais produtos, cada vez melhores”.

Ele também elogiou os Estados Unidos, sublinhando que “o comércio exterior entre os dois países é o melhor que nós temos, porque trabalha muito com produtos com maior valor agregado. Queremos melhorar essa balança para que o Brasil possa exportar mais para os Estados Unidos, especialmente aqueles produtos que qualifiquem mais a indústria brasileira junto à maior economia do mundo”.

Abaixo, a íntegra da entrevista:

Comex do Brasil: No final do ano passado, o senhor afirmou que “o comércio exterior do Brasil pode superar US$ 1 trilhão (ainda) em 2024”. Nos primeiros cinco meses do ano a corrente de comércio brasileira totalizou US$ 241,7 bilhões, o que inviabiliza totalmente a concretização de seu prognóstico. O senhor acredita que essa meta ambiciosa poderá ser alcançada até o último ano do mandato do presidente Lula da Silva?

Jorge Viana: Eu disse e repito que temos que mirar US$ 1 trilhão, essa é a nossa meta.  Nós podemos ampliar e estamos aumentando o fluxo do comércio exterior brasileiro, o que depende de nós, claro, mas também do cenário mundial. O fato é que podemos fazer mais e melhor. O país já perdeu tempo demais, especialmente no governo passado. Agora, com a diplomacia presidencial do presidente Lula, estamos avançando muito e vamos seguir nessa direção, ampliando nossa balança comercial. Nos últimos anos, o fluxo de comércio exterior do Brasil, por conta de políticas equivocadas, deixou de crescer, e ainda se criou uma barriga de crescimento baixo, e até negativo, e que precisa ser recuperado. Houve perdas significativas na relação com diversos países. Só que agora nossa política comercial não é ditada mais por ideologia, como fizeram antes de voltarmos ao governo. Esse é um governo que defende os interesses do Brasil e está retomando e promovendo relações comerciais com todos os mercados que são estratégicos para nós. Sem preconceitos. É um privilégio negociar com os EUA, com a China, com o mundo inteiro. Alcançar esse US$ 1 trilhão não é só uma marca histórica, significa gerar mais emprego, renda, aumento de capital e a presença de empresas brasileiras no Brasil e no mundo. Vale destacar que nossa exportação está crescendo muito em volume, ainda que esteja caindo em preço, por conta do comportamento das commodities. De janeiro a maio, nossas exportações cresceram 7,4% em volume, enquanto caíram 4,5% em preço. Essa tendência já tinha se verificado ano passado, o que afeta o valor total exportado. Ainda assim, temos batido recordes em 2023 e 2024.

“O Brasil voltou a ser protagonista no cenário internacional no governo Lula”

Comex do Brasil: Oitava economia mundial, o Brasil figura em vigésimo-oitavo no ranking do comércio internacional. A que se deve essa participação tão modesta de uma economia importante como a do Brasil no comércio internacional?

Viana: Sem querer ficar olhando no retrovisor, mas de olhos voltados para o futuro, vou reafirmar: o Brasil perdeu tempo ao misturar negócios com política. Comércio é comércio, negócios são negócios – relações políticas à parte. Estamos usando todo o nosso arsenal de ferramentas comerciais e diplomáticas para que o mundo redescubra o Brasil, e estamos tendo bastante sucesso nisso. O Brasil voltou a ser protagonista no cenário internacional no governo Lula, obtendo resultados históricos no comércio exterior. O saldo da balança comercial registrado em 2023 foi de US$ 98,9 bilhões, o maior da história, com aumento de 60% em relação ao ano anterior. Desde o início de 2023 já abrimos 150 mercados em 52 países no agronegócio. O Brasil reassumiu o papel de liderança entre os países do Sul Global. Na ApexBrasil, em nossa missão de promover as exportações e atrair investimentos para o país, estamos trabalhando incansavelmente pela reconquista de espaços perdidos nos últimos anos, além de conquistar novos mercados. O país vem se reaproximando de antigos parceiros comerciais e criando laços, abrindo mercados no mundo todo. É uma verdadeira reconstrução. Lembrando sempre que, por trás de cada novo empreendimento exportador, está a geração de empregos, renda e desenvolvimento.

Da nossa parte, nós criamos projetos inovadores e estamos impulsionando o trabalho da ApexBrasil. Temos convênios de promoção com os principais setores da economia e desenvolvemos novas estratégias, como o programa Exporta Mais Brasil, que leva os compradores estrangeiros a todos os estados do país para ver de perto o potencial da nossa produção e fazer negócios direto com nossas empresas. Estamos trabalhando para diversificar a origem de nossas exportações, aumentando a participação de empresas das regiões Norte e Nordeste no comércio internacional. Também estamos tendo um foco especial nas pequenas e médias empresas, oferecendo qualificação e estímulo para que possam exportar. Da mesma forma, estamos dando atenção especial à questão da equidade de gênero tanto internamente quanto no mercado exportador, com o programa Mulheres e Negócios internacionais, que atende empresas lideradas por mulheres. Criamos também a Plataforma Brasil Exportação, que conecta, de forma gratuita e simples, empresários a prestadores de serviço de comércio exterior, e nossa área de Inteligência vem desenvolvendo estudos fundamentais como os Perfis de Comércio e Investimentos de diferentes países e blocos e os Mapas Estratégicos de Mercados e Oportunidades Comerciais, que permitem aos empresários, de todos os portes, enxergarem os melhores caminhos para o processo de exportação. No ano passado, tivemos um número recorde de empresas apoiadas pela Apex – foram mais de 17 mil, um aumento de 18% em relação ao ano anterior – o que reflete o êxito da nossa gestão, que vem implementando uma série de programas e ações dedicados à capacitação e à inclusão de novas empresas no ranking de exportadoras brasileiras. Fomos também destaque no maior evento climático do mundo, a COP28, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, e sediaremos esse ano, no Rio de Janeiro, a Cúpula de Líderes do G20. No ano que vem vamos liderar a Expo Osaka 2025. Voltamos ao jogo.

“É crucial que o Brasil expanda as exportações da Amazônia”

Comex do Brasil: Ao assumir a presidência da ApexBrasil, o senhor destacou entre as metas principais de sua gestão a busca de uma maior participação dos estados amazônicos no comércio exterior brasileiro. Essa participação está crescendo? Em caso afirmativo, o aumento se enquadra na expectativa que o senhor tinha àquela época?

Viana: Por ter voltado ao centro das atenções na agenda internacional, o Brasil está com a oportunidade não apenas de liderar as discussões em torno de um novo modelo de desenvolvimento, baseado na exploração sustentável da floresta, com respeito à fauna e à flora, como pode ganhar ainda mais espaço no mercado internacional com os produtos originários da floresta e produzidos de maneira sustentável. É crucial que o Brasil expanda suas exportações na Amazônia, criando mais espaço para produtos em consonância com a floresta. Então esse é um dos desafios que nós escolhemos encarar: dar uma atenção especial à Amazônia Sul-Americana, uma das regiões com maior valor para acumulação de poder e riqueza no sistema internacional. Por isso, nós criamos, no ano passado, o Exporta Mais Amazônia, para fomentar as exportações de setores compatíveis com a floresta e com alto valor agregado da Amazônia brasileira.

Assim como o Exporta Mais Brasil, o Exporta Mais Amazônia busca aproximar o empresariado amazônico dos mercados internacionais, organizando o setor produtivo e trazendo os compradores do mundo todo para conhecer o potencial da região. O programa já gerou mais de R$ 50 milhões em negócios que estão sendo reinvestidos na região. E não é só vender mais: cuidar da Amazônia também passa por valorizar os produtos sustentáveis que geram prosperidade para quem vive e cuida desse patrimônio. Um exemplo é a promoção da exportação da castanha-do-Brasil. Extraída por comunidades locais, em áreas de manejo florestal, o produto promove a sociobiodiversidade. É produzir mais e vender mais, mantendo a floresta de pé e desenvolvendo as comunidades locais. Assim, mostramos ao mundo a potência do Norte brasileiro, que abriga quase 18 milhões de habitantes e representa 45% do território brasileiro.

Estados do Norte e Nordeste, novos atores do comércio exterior brasileiro

E não só no Norte. Nós estamos comprometidos a promover o nosso Nordeste também. Não faz sentido os lugares mais ricos exportarem tão pouco – e hoje as regiões com maior potencial de crescimento nas exportações são o Norte e Nordeste. São regiões com enorme potencial exportador, mas historicamente com poucas oportunidades. O grande exportador é o Sudeste. Depois o Sul e, em seguida, o Centro-Oeste. O Nordeste e o Norte estão muito atrás e nós queremos mudar isso.

No ano passado, com o programa Exporta Mais Brasil, nós atendemos 965 empresas da região Norte, 79 a mais do que no ano anterior. Dessas, 262 passaram a exportar e 786 foram atendidas em ações de qualificação para exportação, como estudos e painéis de inteligência, webinars, atendimentos dos Escritórios da ApexBrasil (EAs) e pelo do Peiex – o nosso Programa de Qualificação para Exportação. Já no Nordeste, em 2023 a Apex atendeu 2.279 empresas – 54 a mais do que em 2022. Um total de 714 das empresas apoiadas na região exportaram naquele mesmo ano, enquanto 1.723 delas foram atendidas por ações de qualificação e outras 1.028 por ações de promoção comercial, como participação em rodadas e feiras internacionais. Então nós estamos conseguindo, estamos avançando.

Comex do Brasil: O senhor também se apresentou como um defensor de uma maior inclusão das PMEs no comércio exterior brasileiro. Se comparado com países como Itália e Espanha, a participação das pequenas e microempresas brasileiras no comércio internacional é praticamente irrisória. A Apex desenvolve programas como o PEIEX, com o objetivo de alavancar uma maior presença das PMES no comércio exterior. O que mais o senhor destacaria na estratégia implementada pela Agência com esse objetivo?

Viana: O apoio às micro, pequenas e médias empresas é uma grande prioridade da ApexBrasil hoje, ao lado, por exemplo, de promover, qualificar, apoiar e potencializar as empresas de liderança feminina – com o programa Mulheres e Negócios Internacionais -, e da correção da rota de exportações para o Norte e Nordeste brasileiros, incluindo nossa Amazônia. Para terem uma ideia da virada, em 2023, das mais de 17 mil empresas apoiadas pela ApexBrasil , 43% delas são de micro e pequeno porte. O número chega a 48% se incluir atendimento a pessoas físicas. Isso demonstra o esforço da Agência em difundir uma cultura exportadora nos mais variados setores produtivos do país, gerando impacto social e econômico. Também no ano passado, 2.578 empresas aderiram ao nosso Programa de Qualificação, o PEIEX, e quase 60% delas são micro e pequenas empresas. Nos ciclos entre 2021 e 2023, o PEIEX atendeu 5.334 empresas, sendo que destas 827 já exportaram e geraram US$ 3,16 bilhões. E as exportações das empresas apoiadas pelo PEIEX na região Norte tiveram forte aumento também, passando de pouco mais de US$ 537 mil para US$ 2,6 milhões. Por que essa é a ideia: qualificar empresas que nunca exportaram ou que são iniciantes para que a exportação ocorra de forma planejada e segura, aumentando as chances de êxito e a longevidade dessas empresas no mercado internacional.

Como exemplos recentes, podemos citar a LAC Flavors, evento ocorrido em Manaus, em junho, voltado para empresas de alimentos e bebidas da América Latina e Caribe, organizado pelo BID com apoio da ApexBrasil, pequenas e médias empresas chegaram a fechar, segundo estimativas, US$ 40 milhões em exportações após as rodadas de negócios. No ano passado, a ApexBrasil levou 41 MPE´s ao Paraguai e à Bolívia para encontros de negócios com empresários locais.

Importante destacar, ainda, as parcerias da ApexBrasil com o Sebrae, com quem assinaremos convênio nos próximos dias para atendimento de pequenas empresas, e Banco do Brasil, que se juntou recentemente à nossa Plataforma Brasil Exportação, que já reúne mais de 600 serviços de comércio exterior. A iniciativa amplia o portfólio de serviços disponíveis na plataforma, principalmente para soluções de câmbio, crédito e financiamento para exportação, voltados para micro, pequenas e médias empresas brasileiras que desejam exportar seus produtos. Esse foi mais um passo fundamental para o fomento ao desenvolvimento sustentável e crescimento econômico do país, favorecendo a inclusão de pequenas e médias empresas na jornada da internacionalização.

Segundo dados do MDIC, em 2023, das 28.524 empresas exportadoras brasileiras, 11.456 eram micro e pequenas empresas, ou seja, 40% da quantidade total de empresas engajadas nas exportações. Em valor, contudo, essas empresas representaram US$ 2,7 bilhões, ou seja, pouco menos de 1% do total exportado pelo Brasil. Precisamos mudar esse jogo.

“Existe uma disputa de mercados e não uma guerra comercial entre Brasil e China”

Comex do Brasil: Setores produtivos brasileiros como os de calçados e siderurgia são duramente afetados pela concorrência da China, maior parceiro comercial do Brasil. O presidente da Abicalçados, Haroldo Ferreira, classificou como “predatória” a concorrência desleal dos calçados chineses no mercado brasileiro. Ele disse que, com a prática de dumping, a China poderá dizimar a indústria calçadista nacional. Como o senhor analisa essa questão? O governo brasileiro deveria denunciar essa concorrência desleal da China na OMC?

Viana: É preciso entender que cada país procura defender seus próprios interesses. Claro que abusos não são tolerados e a diplomacia e o direito internacional existem para dirimir isso, equilibrar esse jogo. Mas não é uma guerra. O comércio entre Brasil e China atingiu o patamar histórico de US$ 157,5 bilhões em 2023 e tem potencial para crescer muito mais. Nesse ano, Brasil e China celebram 50 anos do estabelecimento de relações diplomáticas. Cada país mudou muito nesses 50 anos. Estivemos na China no mês passado, e lembro que temos um escritório em Pequim. Vivemos uma relação madura e promissora entre a primeira e a terceira maiores economias do Sul Global. Somos o maior parceiro comercial da China na América Latina e a China é a maior parceira comercial do Brasil no mundo. Os desafios, claro, serão enfrentados, como em toda pauta comercial. Inclusive sofisticando a pauta de exportação brasileira para a China, hoje extremamente concentrada em commodities. Durante a última visita do vice-presidente Geraldo Alckmin à China, mês passado, com intermediação da ApexBrasil, nós firmamos uma venda de meio bilhão de dólares de café para a Luckin Coffee, a maior rede de cafeterias do país asiático. Sem perder o agro de vista, precisamos ampliar a venda de produtos de maior sofisticação tecnológica da indústria de transformação.

Comex do Brasil: Além de invadir o mercado brasileiro, e nada melhor para exemplificar isso que a crescente exportação dos carros elétricos chineses, que têm no Brasil seu maior mercado no exterior, calçados, veículos, produtos siderúrgicos e muitos outros bens estão substituindo o Brasil nas importações de países vizinhos como a Argentina, Colômbia, Peru e até mesmo o México, clientes quase cativos do Brasil nesses segmentos. O senhor considera que o Brasil agiu corretamente ao considerar a China como “economia de mercado”? Como combater a concorrência predatória dos chineses?

Viana: Não vejo como uma “invasão” de mercado. Há uma disputa de mercados. Temos que ser mais competitivos, nos preparar para competir, estimular nossas exportações, apoiar nossas empresas. É o que a Apex Brasil, em seu âmbito de atuação, tenta fazer, e o governo brasileiro também. Mas a China é uma economia de mercado, enorme, pujante, e isso é um fato. Temos que ser competentes, exportar mais e melhor, vencer a concorrência entrando em mais mercados com mais produtos, cada vez melhores. A China é uma potência ascendente, e somos parte desse tabuleiro geopolítico, onde eles sacudiram o planeta e afetaram as relações comerciais no mundo todo. Não há uma perseguição particular ao Brasil. A China é o principal destino das exportações do Brasil. As vendas brasileiras para o país no ano passado ultrapassaram, pela primeira vez, o valor de US$100 bilhões, e o comércio bilateral entre os países chegou a US$ 157,5 bilhões – como disse, com forte potencial para crescer. No último ano, o Brasil foi o principal fornecedor de soja, carne bovina, celulose, milho, açúcar e carnes de aves ao país asiático. Além disso, tivemos a segunda maior participação de mercado nas vendas de minério de ferro, atrás apenas da Austrália, e de algodão bruto, atrás dos Estados Unidos. “Invasão” é termo de guerra, essa é uma disputa comercial.

Comex do Brasil: Em relação à China, outro fato chama a atenção: as exportações brasileiras se concentram em produtos básicos, de baixo valor agregado e apenas três deles (soja, minério de ferro e petróleo) respondem por mais de 70% das exportações totais para aquele mercado. O senhor acha que o Brasil está fadado a ser apenas e tão somente o fornecedor de alimentos e commodities minerais para a China, sem conseguir exportar nenhum bem de maior valor agregado para aquele mercado?

Viana: Cada comércio bilateral tem sua história, seu momento, suas mudanças. Mais da metade do superávit comercial brasileiro vem das relações comerciais com o gigante asiático. A China, até por sua enorme população, de 1,4 bilhão de habitantes, precisa de commodities. Mas o Mapa Bilateral de Comério e Investimentos Brasil-China, que lançamos recentemente, identificou 400 oportunidades comerciais para exportações brasileiras para a China, que somam mais de US$ 800 bilhões, inclusive em setores de maior valor agregado. A população chinesa vem envelhecendo, o que poderá afetar – e sofisticar – o padrão de consumo do país nos próximos anos. Portanto, as oportunidades de expansão de perfil de exportação mais sofisticado existem. É, sim, importante a diversificação das exportações brasileiras, de modo a aumentar a participação de produtos de maior valor agregado. A ApexBrasil, não por acaso, tem 19 projetos setoriais com foco na China abrangendo setores como casa e construção, moda, alimentos e bebidas, entre outros.

“Comércio com os EUA é o melhor que temos”

 Comex do Brasil: Diferentemente do que acontece em relação à China, o Brasil mantém com os Estados Unidos um intercâmbio comercial em que bens industrializados (inclusive aviões) figuram entre os principais itens embarcados para o sofisticado e disputadíssimo mercado americano. É verdade que o comércio “inter companies” é um fator relevante nesse intercâmbio (o que não acontece com os chineses), mas não é o único responsável por essa pauta exportadora qualificada. Como o senhor analisa a atual situação das relações brasileiro-americanas? O senhor acredita que o Brasil deveria, a exemplo do México, aproveitar melhor o fator “nearshoring” e o gap criado pela “guerra comercial” entre os EUA e a China para aumentar as exportações para o mercado americano?

Viana: Construímos recentemente, junto com a Amcham, a Câmara de Comércio Brasil-EUA, um documento que traz todas as oportunidades de negócios para Brasil e Estados Unidos, que farão toda a diferença daqui para a frente. O comércio exterior entre os dois países é o melhor que nós temos, porque trabalha muito com produtos com maior valor agregado, chegando à venda de aeronaves. Mas esse comércio andou muito estagnado. Não pode haver nenhuma condicionante do Brasil para ampliar o comércio com os EUA. O Mapa de Comércio e Investimentos Brasil-Estados Unidos que publicamos recentemente aponta quase mil oportunidades de negócios. Queremos melhorar essa balança para que o Brasil possa exportar mais para os EUA, especialmente aqueles produtos de qualifiquem mais a indústria brasileira junto à maior economia do mundo. Claro que tudo avança quando há mais sinergia entre os governos, mas nossos negócios têm que estar blindados, mesmo quando os governos eventualmente não se entendem, porque negócios são sempre à parte. Essa agenda da transição energética é muito importante para o Brasil se posicionar no mundo, porque é um dos grandes problemas do planeta. Temos um espaço enorme para ocupar. Sem prejuízo dos nossos negócios na Ásia, que hoje é um centro comercial importantíssimo a ser disputado, sem prejuízo de crescermos os negócios com a África, sem prejuízo de trabalharmos com a Europa, com nossos vizinhos sul-americanos e caribenhos, com todo o mundo. Sem prejuízo de nada disso, temos que entender o espaço dos EUA. Esse é o Brasil que queremos trabalhar.

Confiança no futuro do Acordo Mercosul-UE: “é um acordo ganha-ganha; queremos chegar lá”

Comex do Brasil: Mais de 20 anos após o início das negociações, o Acordo de Livre Comércio entre o Mercosul e a União Europeia segue estagnado. Os dois blocos perderam importantes janelas que se abriram à conclusão das negociações. Há quem diga que o acordo virou letra morta e que dificilmente virá a ser implementado. Qual é a avaliação do senhor sobre o fracasso desse processo negociador?

Viana: Não considero que haja um fracasso, há tempos e circunstâncias. Mas ainda existe a possibilidade que esse acordo seja celebrado. Essas negociações entre os dois blocos se arrastam há 25 anos e a Comissão Europeia reiterou o interesse em concluir o acordo – apesar de alguma resistência da França e de outros países, que tentam defender sua produção interna. Não tenho dúvida de que vamos avançar no governo do presidente Lula, com sua diplomacia comercial, até porque seguir em frente interessa a todos os envolvidos.

Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) concluiu que o Brasil seria beneficiado em termos de aumento do Produto Interno Bruto (PIB), de investimentos e de ganhos na balança comercial caso o acordo de livre comércio entre em vigor. Entre 2024 e 2040, o acordo, segundo esse estudo, provocaria um crescimento de 0,46% no PIB brasileiro – o equivalente a US$ 9,3 bilhões a preços constantes de 2023 –, em relação ao cenário de referência. O acordo aumentaria os investimentos no Brasil em 1,49%, na comparação com o cenário sem a parceria. Nesse sentido, a exemplo do PIB, o Brasil também teria vantagens substanciais. As exportações, por sua vez, aumentariam continuamente no período até alcançarem um ganho acumulado de US$ 11,6 bilhões, como resultado de três possíveis efeitos: a queda das tarifas de importação na UE; o aumento das quantidades exportadas em alguns setores, em função das cotas de exportação concedidas pela UE; e a redução do custo doméstico de insumos e de bens de capital propiciado pela queda das tarifas no país, tornando os produtos brasileiros mais baratos e competitivos no mercado internacional. No caso da União Europeia, as importações cresceriam mais rapidamente. No ano passado, a ApexBrasil também lançou um estudo que aponta como a eliminação tarifária gerada pelo eventual acordo entre os blocos poderia abrir oportunidades para empresas brasileiras.  É o acordo do ganha-ganha, que beneficiaria a todos, e queremos chegar lá.

“Com o presidente Lula, o Brasil está de volta ao jogo. Nossa balança comercial é histórica. Nunca exportamos tanto”

 Comex do Brasil: Pouco mais de um ano na presidência da ApexBrasil, o senhor desponta como um dos mais, senão o mais, ativo, diligente e eficiente presidente que a Agência teve desde a sua criação. Qual é o balanço que o senhor faz desse primeiro ano marcado pelo dinamismo e eficácia de sua gestão? Quais são as principais metas para o segundo semestre deste ano e para 2025?

 

Viana: O que posso dizer é que, enquanto presidente da ApexBrasil, dedico o meu tempo a manter a Agência como uma esperança no novo momento do país, ao lado do presidente Lula, na retomada da diplomacia presidencial do Brasil com o mundo. O Brasil está de volta ao jogo! Os números amplamente citados acima falam por si só. Nossa balança comercial é histórica, o Brasil nunca exportou tanto, nunca estivemos em tantos países e nunca abrimos tantos caminhos para o empresariado nacional exportar. Claro que a sólida estrutura técnica e institucional da ApexBrasil permitiu o imediato ajuste de rumo e planejamento, garantindo, já no exercício de 2023, um robusto cronograma de trabalho para promoção das exportações dos produtos e serviços brasileiros e da atração de investimentos estrangeiros, contribuições vitais para respostas que a economia nacional pede com urgência. Nosso calendário prevê centenas de feiras, missões empresariais e rodadas de negócios. Mas prevê, acima de tudo, a construção de um Brasil mais justo. Transfiro meus elogios à equipe da ApexBrasil e a todos os segmentos da economia, empresas e produtores pela parceria e pelo apoio ao trabalho que têm apontado uma nova união pela valorização dos nossos produtos e da marca Brasil em todo o mundo.

 

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