Primeiro-ministro de Singapura sintetiza perplexidade da Ásia-Pacífico com tarifaço de Donald Trump

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Da Redação (*)

Brasília – O primeiro ministro de Singapura, Lawrence Wong definiu com uma frase simples e direta um sentimento que perpassa pelos países da Ásia-Pacífico diante das tarifas impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a todo o mundo e em especial aos aliados tradicionais americanos da região.

Segundo Wong, “essas não são ações que se faz com amigos”. Assim, o mandatário singalês definiu um sentimento que não está restrito ao seu país, mas que se espalha pela região da Ásia-Pacífico em resposta às tarifas comerciais “recíprocras” anunciadas por Trump.

A declaração de Wong sintetiza uma onda de decepção e perplexidade que se espalha pelos países da região e foi replicada pelas lideranças políticas de outros países da área. Assim, o que começou como uma “marola” poderá se transformar em um tsunami capaz de causar grandes estragos nas relações entre Estados Unidos e alguns de seus aliados mais importantes e tradicionais em todo o planeta.

Num primeiro momento, as lideranças da Ásia-Pacífico mostraram-se surpresas com as chamadas “tarifas recíprocas” unilaterais e indiscriminadas dos EUA, que consideraram um retorno ao “protecionismo” do passado e uma traição à própria ordem comercial global estabelecida pelos Estados Unidos.

Algumas economias regionais afirmam que considerarão todas as contramedidas, sem descartar a imposição das mesmas tarifas sobre produtos americanos, enquanto outras estão interessadas em negociar com os EUA. No entanto, a política mais recente dos EUA foi um duro golpe para o espírito do contrato, um fundamento da ordem internacional, e isso significa que qualquer novo acordo poderá ser descartado novamente se os Estados Unidos quiserem.

DE SINGAPURA, A CRÍTICA MAIS DURA A TRUMP

Na terça-feira da semana passada, as críticas ganharam voz e rosto explícitos, quando Lawrence Wong criticou as medidas anunciadas por Trump alertando que o mandatário americano “vai acelerar a fragmentação da economia mundial” e levará a uma mudança radical nos fluxos comerciais internacionais.

Mandatário de um dos mais leais e tradicionais aliados dos Estados Unidos  na região, Wong lembrou que “Singapura tem um acordo de livre comércio com os Estados Unidos, impõe tarifas zero sobre as importações americanas e tem um déficit comercial com os Estados Unidos. Se tarifas fossem realmente recíprocas… a tarifa para Singapura deveria ser zero”. Com o novo aumento de tarifas dos EUA, Cingapura está sujeito a uma tarifa de 10%.

Não é a primeira vez que Wong critica a política americana. Na sexta-feira da semana passada (5), ele afirmou que “estamos entrando em uma nova fase, mais arbitrária, protecionista e perigosa” em relação à tarifa americana.

Os Estados Unidos estão “abandonando todo o sistema que criaram”, disse ele, alertando que a nova abordagem de aplicar tarifas recíprocas país a país é “uma total rejeição da estrutura da OMC”.

Como um dos aliados mais próximos dos Estados Unidos na região, o Japão está também sujeito a uma tarifa de 10% e ao comentar a medida, o primeiro-ministro japonês, Shigeru Ishiba, disse ao presidente Donald Trump, por telefone na noite de segunda-feira (7) que eles deveriam buscar uma cooperação que beneficie ambas as nações, e não tarifas, e expressou preocupação de que as tarifas americanas enfraqueçam a capacidade de investimento das empresas japonesas.

Outro país da Ásia-Pacífico, a Austrália, também foi atingido pela arbitrariedade praticada pelo presidente americano. Segundo o Tesouro australiano, as novas tarifas americanas causarão uma queda de 0,1% no PIB real da Austrália e um aumento temporário da inflação de 0,2% em 2025.

O tesoureiro Jim Chalmers afirmou que “agora os danos causados ​​por essa decisão tarifária estão muito claros para todos verem”, acrescentando que a escalada das tensões comerciais lança uma “sombra” sobre a economia global.

ECONOMIA REGIONAL DURAMENTE GOLPEADA

A maioria das economias da região Ásia-Pacífico é voltada para a exportação, independentemente de se tratar de produtos agrícolas primários ou produtos eletrônicos avançados. Isso se formou no processo de globalização, beneficiando as economias regionais e os Estados Unidos.

Tomando a Malásia como exemplo, o setor manufatureiro da Malásia contribuiu com 23,2% para o PIB em 2024, avaliado em US$239,38 bilhões. Uma parcela significativa veio de indústrias voltadas para a exportação, notadamente elétricas e eletrônicas, petróleo, produtos químicos, borracha e plástico, de acordo com a Kenanga Research, uma empresa de pesquisa malaia.

William Ng, presidente da Associação de Pequenas e Médias Empresas da Malásia, afirmou que essas tarifas provavelmente afetarão significativamente as exportações malaias, especialmente nos setores mencionados, visto que esses estão entre os principais contribuintes para o comércio da Malásia com os Estados Unidos.

“As tarifas mais altas levarão ao aumento de custos para importadores e para exportadores, reduzindo nossa competitividade não apenas no mercado americano, mas também em outros mercados, e potencialmente afetará empregos e investimentos entre PMEs”, disse ele.

Os riscos no setor manufatureiro da Malásia estão aumentando em meio à crescente incerteza em torno das últimas políticas comerciais dos EUA, afirmou a Kenanga Research.

Por sua vez, Danusha Gihan Pathirana, economista do Instituto de Economia Política do Sri Lanka, afirmou que o impacto das tarifas americanas será severo e abrangente.

As indústrias exportadoras do Sri Lanka, especialmente o setor de vestuário, serão duramente atingidas. Com a nova tarifa, os exportadores do Sri Lanka agora correm o risco de perder pedidos e potencialmente realocar a produção para países com custos mais baixos, disse ele, acrescentando que “milhares de trabalhadores do setor de vestuário, entre nossa força de trabalho mais produtiva, correm o risco de perder seus meios de subsistência”.

Kin Phea, diretor-geral do Instituto de Relações Internacionais do Camboja, um braço da Academia Real do Camboja, afirmou que as tarifas americanas são um jogo em que todos perdem, podendo agravar as tensões comerciais e provocar medidas retaliatórias de outros países, prejudicando, em última análise, as relações comerciais internacionais.

“Essa medida destaca explicitamente o egoísmo, o protecionismo, o unilateralismo e o isolacionismo dos EUA”, disse ele, acrescentando que, com o tempo, essas políticas protecionistas podem sufocar o crescimento econômico e a inovação, desencorajando as empresas a otimizar as cadeias de suprimentos ou investir em novas tecnologias.

“Essas políticas não prejudicarão apenas a economia global, mas também a dos próprios EUA”, afirmou ele. “É essencial que todas as nações trabalhem juntas com foco para manter um sistema de comércio global inclusivo e pluralista, além de estabelecer alternativas”.

(*) Com informações da Agência Xinhua

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