Aurea Santos/ANBA
São Paulo – Os países do Norte da África querem produzir mais alimentos e buscam apoio no conhecimento da produção e na tecnologia brasileira na área da agronegócio. Possibilidades de cooperação foram debatidas no seminário Brasil e Norte da África – Oportunidades para o Agronegócio e a Segurança Alimentar, realizado nesta terça-feira (24) em São Paulo.
O evento foi promovido pelo Instituto Brasil-África, foi realizado na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). O seminário contou com a participação de autoridades do Sudão, Mauritânia, Egito, Marrocos e Tunísia, além de representantes do governo do Brasil e de empresas nacionais que atuam no continente africano.
Hadil Fontes da Rocha Vianna, subsecretário-geral de Cooperação, Cultura e Promoção Comercial do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, apresentou números do comércio entre o país e as nações norte-africanas e apontou a necessidade de aumentar o valor agregado das trocas comerciais entre as regiões.
“Nosso comércio com os países da sub-região (Norte da África) tem apresentado constante crescimento, tendo aumentado de US$ 7,8 bilhões em 2010 para US$ 9,1 bilhões em 2014. Com relação ao comércio agrícola, especificamente, observou-se, no mesmo período, crescimento de 18,5%. Com efeito, mais de 70% das exportações brasileiras para o Norte da África são, atualmente, compostas por produtos agrícolas”, informou.
“Faz-se necessário, contudo, que esse relacionamento comercial venha a diversificar-se ainda mais, estendendo-se a produtos de maior valor agregado e de base tecnológica, a exemplo de máquinas e equipamentos agrícolas, automóveis e outros produtos manufaturados, de maneira a nos beneficiarmos da capacidade produtiva e inventiva das indústrias brasileira e africana em favor da prosperidade dos nossos povos”, apontou Vianna.
Aurea Santos/ANBA
Michel Alaby, diretor-geral da Câmara Árabe, destacou a importância dos países africanos e americanos na garantia de fornecimento de alimentos ao mundo. “Minha teoria é que o futuro dirá que temos dois continentes principais em termos de segurança alimentar, que são o americano e o africano, e o maior consumidor, como já se vê, é o asiático”, disse. Alaby mediou um dos painéis.
Flávio Eduardo Castelar, diretor-executivo do Arranjo Produtivo Local do Álcool (Apla), órgão que reúne agentes da cadeia agroindustrial da cana-de-açúcar, falou sobre as oportunidades de produção da planta nos países norte-africanos. Para ele, o Sudão, por exemplo, oferece um bom mercado para os negócios da cana, pois o país está desenvolvendo diversos projetos para aumentar a produção. “Eles também misturam álcool na gasolina”, disse, prática existente também no Brasil.
Castelar deu ênfase também às possibilidades de ampliação de vendas de maquinário agrícola para os sudaneses. “Toda a parte de colheita da cana já é mecanizada, o que abre várias oportunidades para as máquinas. E eles caminham para o plantio mecanizado, coisa que eles ainda não têm”, ressaltou.
Os custos da produção agrícola no Sudão foram destaque na apresentação de Mudathir Abdulghani Hassan, ministro da Agricultura, Pecuária e Irrigação de do Estado de Cartum. Segundo ele, os gastos com irrigação, por exemplo, podem representar até 49,5% do total de custos da produção de vegetais e até 84,2% dos custos da produção de frutas em seu país.
Larbi Moukharik, embaixador do Marrocos em Brasília, afirmou que seu país “tem vocação agrícola”, mas destacou a modernização do setor por lá. “O agricultor está se tornando um empreendedor, um empresário”, disse, ressaltando a profissionalização da agricultura marroquina, impulsionada pelo chamado Plano Verde, programa criado em 2008 para desenvolver o setor agrícola.
Karim Sebti, representante para o Brasil da empresa marroquina Atlas Olive Oils, informou que a nação norte-africana produz 150 mil toneladas de azeite de oliva por ano e exporta cerca de 20 mil toneladas. Ele disse ainda que sua empresa está negociando para vender o produto a uma grande cadeia de supermercados brasileira.
Abdellahi Nagi, embaixador da Mauritânia no Brasil, contou que a agricultura responde por 14% do PIB de seu país e que o governo criou diversos mecanismos para desenvolver o agronegócio. Entre os itens com maior potencial de exportação, ele destacou os peixes.
“Ainda não exportamos peixes para o Brasil. Nossos principais clientes são os países da União Europeia e o Japão. A demanda [brasileira] existe, mas não exportamos por processos burocráticos”, apontou.
A pesca, afirmou Nagi, também pode oferecer oportunidades de transferência tecnológica. “Exportamos o peixe praticamente saído do mar. Estamos procurando parcerias na parte de transferência [de tecnologia]. Vendido em lata, o preço do peixe aumenta até 40%”, destacou.
Aurea Santos/ANBA
Erick Schaltza, chefe do escritório da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em Gana, lembrou que, na África, o setor agrícola é basicamente formado por agricultores familiares e que, enquanto no Brasil a produção cresce mais do que a área plantada, na África isso só acontece com o aumento da área cultivada.
“Na África, a produção cresce [somente] com a entrada de novas áreas. Há a necessidade de se aumentar a capacidade produtiva na África”, disse Schaltza. O pesquisador destacou ainda que não há qualquer projeto da Embrapa sendo desenvolvido nos países do Norte da África. Os projetos da empresa estão concentrados em nações subsaarianas. “Temos uma indústria de equipamentos e serviços bem formadas. É uma das áreas que podemos pensar em ter uma maior aproximação no futuro”, afirmou.
Abderrahmane Chafii, diretor-geral da Agência de Promoção de Investimentos na Agricultura da Tunísia (Apia), informou que seu país oferece subsídios de 7% a 25% para projetos da indústria agroalimentar. Ele também ressaltou a importância da parceria com o Brasil para o desenvolvimento da agricultura familiar na Tunísia. “Precisamos dessa experiência e podemos desenvolver uma cooperação nesse sentido”, avaliou.
Hossam Zaki, embaixador do Egito em Brasília, informou que o consumo de alimentos em seu país supera a produção dos principais produtos do agronegócio lá, mostrando que o mercado egípcio ainda tem uma grande demanda a ser preenchida. “O trigo é um alimento fundamental no Egito. Produzimos cerca de 8,5 milhões de toneladas e consumimos 19 milhões de toneladas por ano”, exemplificou.
Celso Marcondes, diretor para África do Instituto Lula (instituição criada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva) afirmou que os empresários brasileiros não devem esperar mais para aproveitar as oportunidades na África. Segundo ele, o Brasil e os países africanos têm uma característica em comum, que é a necessidade da combinação da agricultura familiar com o agronegócio (grandes produtores).
“Uma grande oportunidade que está aberta é ajudar e trabalhar em parceria com os africanos na produção de alimentos, mas sem permitir que o agronegócio acabe com a agricultura familiar”, disse. “O desenvolvimento do continente africano não vai parar e o Brasil não pode perder oportunidades”, completou.
Também participaram do seminário João Bosco Monte, presidente do Instituto Brasil África; Antônio Bessa, diretor titular adjunto do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp; Newton de Melo, diretor de Relações Internacionais da Fiesp; Christiani Buani, chefe de programas do Centro de Excelência contra a Fome; Alexandre Trabbold, diretor regional do Instituto Brasil África; Lucas Gutierrez, gerente comercial da empresa Agrícola Famosa; Paulo Roberto Araújo, chefe do escritório do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na África; e Rafael Benke, consultor internacional.
Fonte: ANBA