Sueme Mori (*) (**)
Pelo terceiro ano consecutivo, as exportações do agro brasileiro alcançaram valores recordes. Os US$ 166,5 bilhões vendidos ao exterior no ano passado representam um aumento de 4,8% em relação ao resultado de 2022. Mesmo sendo bem abaixo do crescimento de 32% registrado no período anterior, os quase US$ 167 bilhões merecem ser celebrados, especialmente considerando a queda e aparente estabilização dos preços internacionais dos alimentos, que cresceram vertiginosamente nos últimos anos devido à pandemia da Covid-19.
Comparando o desempenho do agro com os demais setores produtivos, fica claro o peso do setor rural para a economia brasileira. De tudo o que o Brasil exportou em 2023, 49% foi agro. O País fechou o ano com superávit total (exportações menos importações) de US$ 98,8 bilhões, graças ao superávit do agronegócio de quase US$ 150 bilhões. Boa parte desse resultado tem relação com a China, que não só continua sendo o principal comprador dos produtos agropecuários brasileiros como ampliou sua relevância, com 36% da participação do total vendido em 2023. Em 2022, o share chinês era de 32%.
Em termos absolutos, a importância das compras chinesas fica ainda mais evidente. Em 2023, o agro exportou US$ 7,7 bilhões a mais do que 2022. O aumento das importações chinesas no mesmo período foi de US$ 9,5 bilhões. Isso significa que a ampliação das exportações para a China compensou a redução das vendas para outros mercados como, por exemplo, para a União Europeia, que comprou quase US$ 4 bilhões a menos no ano passado.
Problemas climáticos em importantes produtores mundiais, como Argentina, Estados Unidos, Índia e Tailândia, causaram quebras de safra e consequente redução da oferta mundial de produtos como soja, milho e açúcar. Com isso, o Brasil vendeu mais. No caso do milho, o Brasil ultrapassou os Estados Unidos e se tornou o maior exportador mundial. Só para a Argentina, as compras de soja em grãos cresceram mais de 1.000%, fazendo com que o país pulasse do 18º lugar para o sétimo principal destino do agro brasileiro em 2023. A soja em grãos continua como a grande estrela da pauta exportadora. Dos quase US$ 167 bilhões exportados no ano passado pelo setor, US$ 53 bilhões foram soja em grãos. Segundo colocado, o milho respondeu por 8% do total (US$ 13,5 bilhões).
Infelizmente, a diversidade da produção nacional não está refletida nos números da exportação nacional. E a solução não é vender menos para a China, nem menos soja em grãos, mas sim ampliar a venda de outros produtos também para outros mercados. A própria China é um mercado gigante com potencial para absorver outros produtos como frutas, mel e café. Aliás, as compras chinesas de café verde do Brasil cresceram 251%, saltando de US$ 79 milhões em 2022 para US$ 278 milhões em 2023.
Em termos de abertura comercial, o Ministério da Agricultura contabilizou 78 aberturas de novos mercados e o Brasil, no âmbito do Mercosul, concluiu o primeiro Acordo de Livre Comércio (ALC) com Cingapura. Que esse seja somente o primeiro ALC com a Ásia, um continente que abriga 6 dos 10 principais destinos das exportações agropecuárias brasileiras: China, Japão, Indonésia, Vietnã, Coreia do Sul e Tailândia.
A ampliação da participação do agro brasileiro em mercados internacionais depende não só do aumento da produção nacional, mas da ampliação do número de produtores e empresas preparados para exportar; do trabalho do governo, em conjunto com o setor privado, para abrir novos mercados; da geopolítica internacional; do grau de abertura/protecionismo dos países e de questões climáticas, que cada vez mais afetam a produção mundial de alimentos.
As questões geopolíticas sempre exerceram influência no comércio internacional e 2023 não foi diferente. A guerra entre Rússia e Ucrânia e o conflito na Faixa de Gaza escancararam o acirramento entre ocidente e oriente. Os impactos no comércio marítimo internacional começaram a ser sentidos no final de 2023.
O futuro incerto do Mercosul com a eleição de Milei na Argentina, a vitória do Partido Democrático Progressista em Taiwan, no início de 2024, e a corrida presidencial em mais de 50 países, incluindo o pleito nos EUA neste ano, devem esquentar ainda mais esse jogo do xadrez geopolítico.
(*) Sueme Mori é diretora de Relações Internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA)
(**) Artigo publicado originalmente no Broadcast