Especialista em comércio exterior Jackson Campos explica por que Trump tem sido tão vocal e agressivo contra a criação da moeda; Brasil seria beneficiado, mas precisaria de cautela
Da Redação
Brasília – Tema central nas discussões entre Brasil e EUA, a criação de uma moeda para as negociações entre os países do Brics é vista como uma ameaça à hegemonia americana. Buscando defender o dólar e seu valor no mercado internacional, o presidente Donald Trump tem sido muito vocal contra o bloco econômico e suas movimentações, deixando claro que a guerra comercial está longe de acabar, mas é necessário entender por que é tão importante para o chefe da Casa Branca essa proteção à moeda americana.
A perda da hegemonia do dólar seria uma catástrofe para a economia americana. Segundo relatório do Congresso dos EUA, cerca de 60% das reservas cambiais globais e quase 90% das transações de câmbio envolvem a moeda e, para o especialista em comércio exterior, Jackson Campos, uma nova moeda tiraria o poder de barganha que os americanos possuem no mercado.
“Os Estados Unidos têm muita influência no cenário internacional e muito se dá por conta de serem a moeda mais aceita globalmente. Uma nova moeda, ainda mais em mercados imensos como China e Rússia, diminuiria a dependência do dólar e a influência americana em todo o globo, causando um grande dano à economia americana, que se beneficia muito com a dolarização e o poder que exerce sobre o comércio internacional”, explica Campos.
Outro ponto é que, por conta do uso massivo e internacional do dólar, os EUA conseguem usar o sistema financeiro global como instrumento de pressão política. Isso significa que, ao impor sanções contra um país, os americanos podem bloquear transações, congelar ativos e limitar o acesso a bancos e sistemas de pagamento internacionais. Isso já acontece hoje contra o Brasil através da Lei Magnitsky, atingindo figuras importantes do cenário político nacional.
“As sanções aplicadas contra brasileiros é uma forma que a dolarização pode impactar diretamente sobre a soberania e economia de outros países. Se o BRICS criasse uma moeda própria para negociações entre seus membros, boa parte dessas operações poderia ocorrer fora do alcance do sistema dolarizado, enfraquecendo a eficácia das sanções e diminuindo o poder dos EUA de influenciar comportamentos políticos e econômicos de outros países. Trump sabe muito bem o que está defendendo e não vai hesitar em tomar medidas mais protetivas se necessário”, avalia o especialista.
Entretanto, o grande problema para os americanos seria a desvalorização do dólar e a dificuldade que a Casa Branca encontraria para financiar a dívida do país, que já ultrapassa aproximadamente US$ 36,56 trilhões em abril de 2025, representando cerca de 120% do PIB do país, segundo o Tesouro Americano.
Sem a força da moeda no mercado internacional, com empréstimos para outros países e seu uso em negociações comerciais, os juros internos começariam a subir e a economia doméstica seria atingida em cheio. “Esse é o ponto mais crucial. O aumento dos preços internamente sinalizaria como um fracasso para o governo republicano e dificultaria muito o cenário para Trump e seus aliados nas próximas eleições. Os americanos não abrem mão do consumo e o presidente sabe da importância da manutenção do poder de compra”, afirma Campos.
E para o Brasil?
Se para os americanos não seria nada interessante a criação de uma nova moeda internacional, para o Brasil, integrante dos Brics, seria uma alternativa de escapar das decisões do FED, ganhando mais autonomia monetária e diplomática. “Seria bom para o Brasil porque diminuiria custos cambiais e volatilidade nas trocas com parceiros como China e Índia, reforçando o comércio no sul global”, diz o especialista.
Entretanto, Campos afirma que é necessário cautela para que o país não fique dependente de Pequim, já que o país asiático é a maior economia dentro do bloco econômico e, possivelmente, tomaria a dianteira na hora da criação das regras do uso dessa moeda.
“Surgiriam desafios de governança e risco de assimetria de poder, especialmente se o protagonismo chinês não for equilibrado por mecanismos de decisão mais democráticos dentro do bloco. O Brasil teria que tentar se proteger e, ao mesmo tempo, conquistar espaço diplomático para conseguir defender seus interesses sem causar atritos com a China e os outros países do bloco. É necessário cautela e muita diplomacia, algo que o governo brasileiro é reconhecido mundialmente”, finaliza o especialista em comex.







