São Paulo – A guerra Rússia-Ucrânia, que está completando um mês neste 24 de março, provocou impacto nos preços da soja, trigo e milho. Desde a madrugada de 24 de fevereiro, quando começou a invasão russa ao país vizinho, o mercado vem sentindo o peso do conflito. “Ainda é cedo para saber qual será a demanda exigida, que dependerá da duração da guerra. Mas o efeito no mercado global, incluindo o Brasil, foi imediato e perdura até agora, mesmo nos grãos que não são produzidos no Leste Europeu”, afirma o presidente da Federação da Agricultura do Estado de São Paulo (FAESP), Fábio de Salles Meirelles.
Na abertura da Bolsa de Chicago, ainda no primeiro dia de conflito, o trigo atingiu US$ 9,26 por bushel (medida equivalente a 27,2 kg) 5,7% acima do fechamento do dia anterior. O milho subiu para US$ 7,19 por bushel, com alta de 5,1%, na mesma comparação. Embora não seja um produto que está na balança das exportações dos países do leste europeu, a soja registrou alta de 5,4%, registrando US$ 17,65 por bushel.
Sobre a alta da soja, a explicação está na organização da sua cadeia produtiva. “Para produzir alguns alimentos ou fabricar ração para animais, dependendo do tipo de produto, é possível substituir alguns tipos de grãos. O óleo de soja pode substituir o óleo de girassol, produzido na Ucrânia, assim, o cenário de incerteza acaba puxando todos os preços para cima, a exemplo da soja que não é produzida na região do conflito. É uma questão de correlação”, explica Cláudio Brisolara, gerente do Departamento Econômico da FAESP.
Lacunas e oportunidades
Rússia e Ucrânia respondem, juntas, por 28% das exportações mundiais de trigo. Na outra ponta, o Brasil importa nada menos que 50% do trigo consumido pelo mercado interno, ou aproximadamente 6,5 milhões de toneladas. A outra metade vem, majoritariamente (85%), de cultivos no Rio Grande do Sul e Paraná. Contudo, as importações são oriundas do Mercosul, principalmente da Argentina, nosso maior fornecedor. Também compramos trigo dos EUA e Canadá, sendo que da Rússia muito pouco se adquire há anos.
No que se refere ao milho, no entanto, existe a possibilidade de aumentar as exportações brasileiras do grão para abastecer o mercado mundial, já que Ucrânia e Rússia são também grandes fornecedores dessa commodity.
Respectivamente, o quarto e o quinto exportadores mundiais do grão em 2020/2021, correspondendo em conjunto 17% de participação no mercado internacional, de acordo com dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Atualmente, nosso país ocupa a terceira posição nesse ranking, atrás de Estados Unidos e Argentina. Produção não faltaria, pois o Brasil tem como ampliar sua produção e exportação.
Conforme a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), há expectativa de aumento de até 29% na safra brasileira de milho de 2021-2022 na comparação com o período anterior, entretanto, essa projeção está sob risco devido às adversidades climáticas que o Brasil vem enfrentando.
De acordo com Brisolara, já existe um aumento na expectativa de produção de milho safrinha, cujo plantio está sendo finalizado agora. “Essa expansão não tem relação com o conflito, mas com a base de comparação do ano anterior, que teve frustração de safra. Contudo, é certo que o conflito incentivará o manejo e os tratos culturais. Com a redução da oferta por esses países envolvidos, certamente haverá uma demanda maior pela nossa produção do grão”, avalia.
O aumento da área de cultivo de trigo no Estado de São Paulo também não está vinculado à guerra, já estava estimado, entretanto, o momento traz novo estímulo. Já em 2020, a Câmara Setorial do Trigo projetava para 2021, um aumento entre 10% e 15% na área de cultivo no Estado de São Paulo. A meta era chegar à produção de 300 mil toneladas, um volume pouco acima das 270 mil toneladas de 2020. “O trigo vai começar a ser plantado a partir de abril, então o produtor deverá ser incentivado a aumentar a área plantada”, reforça Brisolara, que é engenheiro agrônomo.
A ampliação da produção desses grãos, no entanto, dependerá da disponibilidade de fertilizantes para os produtores nacionais. “A dúvida que resta é até que ponto o produtor pode ampliar a sua área, investir mais na lavoura de milho safrinha e, principalmente, na de trigo, considerando que talvez não tenha tantos insumos disponíveis, até porque produtores de outros cultivos, inclusive da safra de verão, estão tentando antecipar suas compras, o que gera ainda mais escassez no mercado de fertilizantes. Este é um ponto importante, pois, de um lado, o produtor vai querer plantar mais. Por outro, terá dificuldade de conseguir alguns insumos, então existe esse trade-off e não sabemos como a situação ficará em termos de produção e rendimento”, conclui.
(*) Com informações da FAESP