Como o comportamento das novas gerações está moldando o ESG nas empresas

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Prof. Dr. Nasser Mahmoud Hasan  (*)

Para falar de futuro, é essencial lembrar de onde viemos. Da Geração Grandiosa (1901–1927) e Silenciosa (1928–1945) aos Baby Boomers (1946–1964), X (1965–1980), Y/Millennials (1981–1996), Z (1997–2012), Alpha (2013–2024) e à recém-chegada Beta (a partir de 2025, nascida na era da IA), cada geração mudou a forma de consumir. Essa linha do tempo explica por que o consumo consciente deixou de ser nicho. Como alertou George Santayana em The Life of Reason (1905), “Aqueles que não conseguem lembrar o passado estão condenados a repeti-lo”.

A história recente mostra, muitas vezes do jeito difícil, que ignorar clima, direitos e governança custa caro. Hoje, com um celular na mão, qualquer pessoa compara, registra e compartilha em segundos. Coerência virou requisito básico: importa o que a marca promete, como entrega e quais impactos gera para as pessoas e para o planeta.

Estamos vivendo uma super disrupção tecnológica. Inteligência artificial, internet das coisas, biotecnologia e nanotecnologias já fazem parte do cotidiano. O efeito imediato é mais transparência: todo produto deixa rastro de origem, de quem produziu, de como foi feito e de qual foi o impacto. As gerações Y e Z transformam valores em escolhas. A Alpha cresceu esperando personalização e propósito. A Beta nasce IA nativa, para quem a tecnologia é o próprio ambiente. Nesse mundo, ética não é diferencial; é o mínimo aceitável.

Por isso, cada vez mais pessoas, especialmente as mais jovens, priorizam marcas que jogam limpo. Quando vêm à tona trabalho análogo à escravidão, insumos adulterados, descarte tóxico, discriminação ou o chamado greenwashing, isto é, quando a empresa finge ser “verde” sem ser, o assunto explode nas redes, vira vídeo, vira pressão e pode virar boicote.

Não é moda: é o coração da marca sendo testado em tempo real. Quem erra e não corrige perde confiança rápido; quem acerta de forma consistente vira referência. Não basta ser sustentável. É preciso provar. Em vez de slogans, pedem-se provas: dados claros, rastreabilidade da cadeia, resultados verificáveis e diálogo aberto.

Nesse cenário, a COP30, que acontecerá em Belém do Pará, é um marco. O mundo voltará os olhos para a Amazônia e para tudo o que se conecta a ela: florestas em pé, cadeias livres de desmatamento, bioeconomia, água, energia, alimentos e as pessoas do território. A conferência tende a elevar a ambição das metas climáticas e a ampliar os recursos para soluções de baixo carbono, com efeitos diretos sobre as empresas.

Na prática, cresce a pressão para reduzir emissões de forma absoluta, inclusive nas cadeias de suprimento, comprovar a origem dos insumos, proteger direitos humanos ao longo da cadeia e apresentar números que façam sentido para o público. Quem já estiver preparado sai na frente; quem deixar para ver depois corre atrás do prejuízo.

É aqui que o ESG (Environmental, Social and Corporate Governance, em português Ambiental, Social e Governança Corporativa) precisa sair do rótulo e virar estratégia de marca. Isso significa integrar sustentabilidade ao desenho do produto, à operação, às finanças e à comunicação.

Na prática, passa por metas claras e auditáveis de clima, água, resíduos, diversidade, equidade e integridade, conectadas ao core do negócio; por governança que mede e orça, com incentivos atrelados a indicadores materiais; por ecodesign, segurança e qualidade como não negociáveis; por rastreabilidade do insumo ao pós-consumo e trabalho digno em toda a cadeia; por transparência radical, falar depois de fazer e explicar falhas e planos de correção; e por diálogo em rede, envolvendo clientes, comunidades e criadores de conteúdo para cocriar soluções.

Os benefícios são claros e se somam ao longo do tempo: atração e retenção de talentos, acesso a novos mercados e capital, reputação e confiança sustentadas por evidências, ética e governança fortalecidas, prestação de contas mais transparente, impacto social positivo percebido, reconhecimento por avaliadores externos, conformidade regulatória e compliance mais robustos, inclusão e equidade no local de trabalho e, no fim, melhor desempenho financeiro com mais inovação.

No Brasil, esse movimento ganha tração com a atuação da B3, do sistema financeiro e das universidades na formação de profissionais que conectam teoria à prática, criando um ecossistema que acelera normas, métricas e talentos.

Também é importante reconhecer a força das redes sociais. Elas não são apenas megafones: viraram um sistema distribuído de responsabilização. O debate contínuo sobre sustentabilidade e meio ambiente, saúde mental e bem-estar, diversidade, equidade e inclusão (DEI), moda e estilo de vida, fitness e cultura forma uma consciência coletiva que redefine valor. Em breve, não estranhe ver cada produto com sua “nota de impacto”, tão comum quanto o preço e o prazo de entrega, para ajudar o consumidor leigo a decidir sem precisar virar especialista.

No fim das contas, pensar o valor do ESG para além do modismo é encarar sustentabilidade como projeto de futuro, ligar passado, que são os aprendizados, presente, que são as evidências, e futuro, que é a inovação, para gerar valor econômico e socioambiental. Y, Z e Alpha já compram com essa régua, e a COP30 tende a deixá-la ainda mais visível. Cabe a cada marca escolher ficar na arquibancada vendo a conversa passar ou entrar em campo para liderar uma prosperidade que faça sentido para as pessoas e para o planeta.

Que a Geração Beta, nascida este ano, encontre marcas que façam do ESG uma prática diária, transformando cuidado em rotina, inovação em inclusão e lucro em legado, e herde um planeta mais justo, resiliente e vivo do que aquele que recebemos.

(*) Prof. Dr. Nasser Mahmoud Hasan é docente do curso de Administração do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), Campus Campinas, onde leciona Teorias da Administração, Empreendedorismo, Gestão da Inovação, Sistemas de Informação Aplicados à Gestão e Gestão Estratégica e Sustentabilidade.

 

 

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