PEC que tramita no Congresso Nacional prevê modificações no modelo de recolhimento de tributos aos entes federados e o fim dos incentivos fiscais, impactando diretamente o planejamento logístico das empresas
Guilherme Giglio e Carolina Verginelli (*)
O sistema tributário brasileiro está prestes a passar por grande transformação, com implicações significativas para a cadeia de suprimentos das organizações do país. Duas mudanças relevantes estão no horizonte das empresas que operam no Brasil. A primeira delas é a alteração no modelo de recolhimento dos tributos sobre o consumo, que passam a ser devidos aos estados e municípios destinatários da transação, isto é, onde ocorre o consumo do bem ou do serviço. A segunda é a previsão de extinção dos incentivos fiscais, que, atualmente, tomam formas distintas em cada estado para atração de empresas e investimentos.
As duas alterações são balizadas pela Proposta de Emenda Constitucional – PEC 45/2019, que tramita no Congresso Nacional e tende a representar mudança estrutural no cenário logístico e tributário. São pontos que, se aprovados, impactam diretamente a cadeia de suprimentos e vão demandar a reavaliação sobre a melhor alternativa e posição geográfica para produção, distribuição ou prestação de serviços para os clientes.
No Brasil, a dualidade entre logística e tributação tem sido fator determinante na definição da localização das empresas. Isso porque, pelo modelo atual, a maior parte dos tributos indiretos, como ICMS e ISS, é recolhida na origem, onde o contribuinte está localizado. A substituição tributária – regime que concentra a tributação na indústria e antecipa o recolhimento do imposto incidente em toda a cadeia – e o diferencial de alíquotas do ICMS adicionam complexidade enorme ao contexto atual, influenciando as estratégias de expansão e posicionamento das empresas.
Com a Reforma Tributária e a criação de dois tributos sobre valor agregado – a CBS e o IBS, em substituição aos cinco tributos do sistema em vigor (PIS, COFINS, IPI, ICMS e ISS), os executivos terão um novo cenário a considerar. A ideia é que o contribuinte passe a pagar o tributo aos estados e municípios para onde os produtos ou serviços serão direcionados e consumidos.
Outro aspecto a ser considerado pelas organizações é a previsão da extinção dos incentivos fiscais, impactando diretamente um número considerável de empresas e investidores que optaram por estabelecer fábricas ou centros de distribuição em determinadas regiões, fundamentados, principalmente, por esses benefícios. Para compensar eventuais perdas de estados e contribuintes, a PEC 45/2019 prevê a constituição de dois fundos.
O principal ponto de exceção da proposta é a manutenção da Zona Franca de Manaus, onde, em tese, os benefícios permaneceriam aplicáveis até 2073. No entanto, o principal questionamento nesse iminente novo cenário é: a forma de produção e distribuição estabelecida pelas cadeias atuais continuarão fazendo sentido?
O momento se mostra oportuno para as organizações revisarem suas cadeias de fornecimento, com foco em melhoria de eficiência e redução de custos operacionais, incluindo aspectos como transporte, armazenagem e nível de serviço. A carga tributária, os incentivos fiscais e a complexidade do ambiente tributário deixam de ser protagonistas na análise de investimentos em plantas e centros de distribuição no país, contribuindo para impulsionar a integração de novas tecnologias e práticas inovadoras na gestão logística.
Em contrapartida, as empresas devem analisar atentamente os incentivos fiscais que ainda permanecerão em vigor até o final do período de transição. Com a possível aprovação da PEC 45 neste ano, a expectativa é que o novo sistema tributário entre em vigor de forma escalonada a partir de 2026, sendo que a extinção total dos benefícios ocorra no final de 2032. Esse tempo pode ser usado pelas empresas para reavaliarem suas estruturas fiscais, aproveitando eventuais benefícios não utilizados e definindo ações de curto, médio e longo prazo, de forma integrada com a estratégia operacional no país.
(*) Guilherme Giglio e Carolina Verginelli são sócios de Consultoria Tributária da Deloitte.