José Augusto de Castro (*)
Vem do latim o termo ”competere”, voar ou procurar juntos. Uma bela expressão que dá origem à competitividade em nosso idioma. Conclui-se, portanto, que competir requer um conjunto de esforços – é a etimologia reafirmando o que vemos todos os dias em nosso cotidiano, o que inclui o comércio exterior.
Empenhadas em produzir bens e serviços competitivos, as empresas investem em pesquisa e inovação, reveem processos internos, qualificam colaboradores, ajustam margens de preços. Fora da alçada das empresas, porém, a realidade tem se mostrado inflexível e cruel. O alto custo Brasil onera os produtos em cerca de 15%, tornando árduo o caminho para sua comercialização no mercado global. Se a competitividade significa esforços conjuntos, quando elos da cadeia não colaboram, a competição pode ser desigual. É o que ocorre com nosso país.
A carga tributária, alta e complexa, é, sem dúvida, uma das principais causas da baixa competitividade dos produtos brasileiros. A Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) esteve no Congresso Nacional algumas vezes esse ano tratando da reforma tributária. Apresentamos os dados que comprovam que as distorções tributárias afetam negativamente as exportações, e todo o país perde quando o comércio exterior não vai bem. Levamos as demandas dos exportadores para o Grupo de Trabalho (GT) na Câmara dos Deputados que analisou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019. A posição da entidade consta do relatório do GT. Defendemos reformas estruturais para reduzir o custo Brasil, e a tributária é a mais relevante das reformas.
Outra questão que vem tirando a competitividade dos nossos produtos é o acúmulo de créditos tributários. A Constituição Federal estabelece que o ICMS não incide sobre as operações de exportação de bens manufaturados, assim como não permite a cumulatividade do imposto e prevê a manutenção dos créditos relativos à compra de insumos que serão utilizados na industrialização de produtos a serem negociados no mercado internacional. Na prática, os exportadores veem o dinheiro bloqueado durante anos, sem perspectiva de ressarcimento.
Muitas vezes, as empresas precisam recorrer a financiamentos em instituições bancárias para manter seus negócios, enquanto os créditos tributários aos quais têm direito continuam retidos. O resultado é a exportação de imposto no lugar de produto. A AEB firmou parceria com um grupo de consultorias e escritórios de advocacia para postular no Supremo Tribunal Federal (STF) a recuperação desses créditos de forma viável e segura.
A desigualdade de nossos itens na pauta global é tamanha que, atualmente, a nossa participação no comércio internacional é somente de 1%, percentual idêntico aos idos de 1980. Naquela época, México, China, Correia do Sul e Índia exportavam menos do que o Brasil, exatamente o oposto de hoje. Só os chineses exportam 13 vezes mais do que nós! Parece que ficamos ancorados em um porto qualquer, 40 anos atrás, vendo navios cada vez mais sofisticados atracarem e desatracarem com suas cargas.
O cenário dos produtos manufaturados é ainda mais desolador. No ano 2000, da totalidade das exportações brasileiras, 59% eram produtos manufaturados apenas 22% eram commodities do agronegócio, minerais e petróleo. Mas com opassar dos anos, veio a regressão. Em 2022, exportamos somente 29% de produtos manufaturados e 57% de commodities. Na balança comercial de manufaturados,tivemos um déficit de US$ 128 bilhões no ano passado.
Nossos manufaturados seguem para a América do Sul, Estados Unidos e Europa – nesses dois últimos mercados, o comércio é por meio de operações intercompany, bem mais ágeis. A China, com seu enorme potencial importador, não compra manufaturados do Brasil porque não tem filiais das empresas que fabricam esses produtos. Com custos altos, o Brasil não consegue competir em igualdade de condições no mercado chinês.
Por que os manufaturados são tão importantes? Porque geram mais riqueza e estabilidade para a economia interna. A redução das exportações de produtos de alto valor agregado representa perdas importantes para o país em mercados, renda e empregos qualificados.
Há pesquisas que mostram que para cada US$ 1 bilhão de produtos manufaturados exportados, são gerados 30 mil empregos diretos e indiretos. Estamos desperdiçando 4 milhões de empregos qualificados. Costumo dizer que o déficit na balança comercial de manufaturados gera atividade econômica, empregos de qualidade e de melhor remuneração, sim, mas no exterior, não no Brasil!
A abertura cada vez maior do mercado global aos nossos produtos e serviços, especialmente os de maior valor agregado, é fundamental não somente para exportadores e outros players do comércio exterior, mas para todos os brasileiros. Portanto, voltando à etimologia de competitividade – “voar ou procurar juntos” -, a responsabilidade para fazer o Brasil competir com chances reais de sucesso não deve ser somente de alguns poucos, mas de governos, iniciativa privada e toda a sociedade civil.
(*) José Augusto de Castro é administrador de empresas de formação, autor de 12 livros sobre comércio exterior e presidente executivo daAssociação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).