Da Redação
Brasília – O Brasil precisa aproveitar a credibilidade e a confiança construídas junto aos países árabes e do Norte da África pelas indústrias do agronegócio e exportadoras de carnes e soja em especial, para aumentar suas exportações para a região. Com presença marcante nesses países, inclusive com plantas produtoras, as empresas brasileiras contribuem de forma significativa para garantir a segurança alimentar e a imagem do Brasil na região é altamente positiva e deve ser mais bem explorada.
Essas são opiniões da diretora do Escritório Comercial da InveseSP em Dubai, Silvia Pierson, que vê nos países árabes, do Norte da África e da Índia, mercados com amplas possibilidades a serem aproveitadas pelas empresas brasileiras exportadoras de alimentos.
Silvia Pierson ressalta que “o Brasil é um grande exportador de proteína animal para a região, que não produz quase nada em termos de alimentos e tem na busca da segurança alimentar uma de suas grandes preocupações. A indústria brasileira possui unidades produtivas nos países árabes e o país tem uma imagem muito diretamente vinculada à segurança alimentar. Por isso, o Brasil é considerado um país parceiro do Oriente Médio e do Norte da África. Além dos produtos tradicionalmente já exportados para a região, existem grandes possibilidades de aumentar as vendas de alimentos processados, dos quais esses países são também grandes importadores”.
O escritório em Dubai foi inaugurado no início do ano pelo governador João Dória e a escolha da cidade, que não é capital dos Emirados, deveu-se ao fato de que Dubai é a cidade mais cosmopolita do Oriente Médio, é a central de compras, de negócios e logística da região, além de contar com uma excelente localização geográfica. A cidade é ainda um grande ponto de compras para a Índia, outro mercado gigantesco e que também tem muito a ser explorado pelas exportadoras brasileiras.
Ao falar sobre o escritório, Silvia Pierson diz que o órgão tem uma estrutura bem enxuta, “pois lidamos com recursos públicos e o que queremos são resultados, fazer a diferença para as empresas e para o estado de São Paulo em termos de comércio e atração de investimentos. Quando o governador João Dória inaugurou os escritórios da InvesteSP na China e em Dubai, sua intenção era de que esses escritórios sigam ativos, independentemente de quem seja o governador, da situação política e econômica do país e do, estado e que tenham continuidade, com o apoio do governo e da iniciativa privada. Temos a missão de identificar as oportunidades de negócios e investimentos na região e de divulgá-las para todo o estado de São Paulo, obviamente sem custo algum”.
A localização do escritório em um país árabe, os Emirados, próxima do Norte da África e também da Índia é apontada pela executiva como um fator relevante: “aqui as distâncias são pequenas. A Índia está aqui ao lado. Tanto em termos de compras quanto em matéria de logística, estar em Dubai faz todo sentido. A localização é estratégica. Além disso, Dubai tem várias zonas livres de comércio, um dos maiores portos do mundo, com taxas portuárias baixíssimas, uma grande estrutura de armazéns terceirizados, próprios, que contribuem para facilitar os negócios na região”.
Café e calçados: mercado em aberto
Poucos meses à frente do escritório, e num espaço de tempo marcado pela epidemia de Covid-19, que impediu a realização de atividades presenciais e limitou a margem de atuação, Silvia Pierson tem feito um mapeamento que já lhe permitiu identificar uma série de oportunidades para aumentar as vendas brasileiras para a região.
Além das commodities do agronegócio, ela menciona produtos do setor médico-hospitalar, lembrando que “esse é um mercado que vem se desenvolvendo muito. Dubai quer ser, e na verdade já o é, o centro de atendimento médico de todo o Oriente Médio e do Norte da África. O governo dos Emirados Árabes tem feito grandes investimentos em alta tecnologia, treinamento de pessoal, equipamentos para hospitais e clínicas médicas. No caso específico de Dubai, a cidade está se tornando um polo importante na região para o tratamento e turismo médicos. Aí também existe um potencial a ser explorado e para isso é preciso identificar produtos e equipamentos que podem ser exportados para a região”.
Ao mesmo tempo em que chama a atenção para essas novas oportunidades de negócios, Silvia Pierson destaca a importância de as empresas brasileiras procurarem ampliar os esforços em busca de mercado para produtos como o café e calçados, tradicionalmente exportados pelo Brasil para a região.
Ela sublinha que “o Brasil é o maior produtor mundial de café, tem um parque industrial muito bem montado para a torrefação, mas quem exporta para o Oriente Médio, o Norte da África e a Índia são a Suíça, Itália e os Países Baixos. Os Emirados Árabes importam hoje mais café da Suíça e dos Estados Unidos que do Brasil. E uma pergunta me ocorre: como deixamos chegar a essa situação?”
E é ela quem responde: “se a Suíça consegue importar o café verde do Brasil, processar, embalar e exportar esse café a um preço como o que o produto vem sendo adquirido aqui nos Emirados, que são o maior exportador da região, o Brasil também pode fazer o mesmo. Para que tal aconteça, é preciso melhorar a nossa logística de acesso ao Oriente Médio, que reconhecemos, não e das melhores. Muitas vezes não temos os navios que seguem diretamente para a região e existem vários outros problemas que dificultam o acesso do produto brasileiro a esse mercado, para o qual os Estados Unidos exportam mais que o Brasil”.
Aumentar as exportações de calçados brasileiros para a região é outro desafio que merece a atenção do escritório da InvesteSP. O Oriente Médio importa cerca de US$ 4,5 bilhões de calçados anualmente e, apesar de não ter a maior população, os Emirados são os maiores exportadores da região porque reexportam boa parte dos calçados importados. Outros grandes importadores são a Arábia Saudita, Israel, Kuwait e Irã.
O Oriente Médio é um importante importador do calçado brasileiro e segundo Silvia Pierson, “existe um potencial muito grande de aumentarmos bastante essas vendas nos próximos anos. Para que isso aconteça é preciso que as empresas do setor calçadista façam um grande trabalho de aproximação com o Oriente Médio e o Norte da África visando abrir mercados. É muito importante que essas empresas invistam em visitas aos países da região. É evidente que esse esforço não pode ser realizado durante a pandemia, mas é imprescindível estar presente aqui através de viagens, de contar com bons representantes locais, tomar todo o cuidado com a apresentação e administração da imagem da marca e da empresa”;
A diretora do escritório da InvesteSP chama a atenção dos exportadores para aspectos fundamentais ao estabelecimento de vínculos comerciais sólidos e duradouros com os países do Oriente Médio e Norte da África: “é preciso estar sempre muito atentos, cumprindo os contratos, não abandonando o importador local. Frequentemente recebo visitas de empresários locais que me dizem que buscam exportadores brasileiros, já contataram várias empresas durante feiras ou rodadas de negócios, solicitaram preços mas não obtiveram nenhuma resposta. Em qualquer país do mundo, e no Oriente Médio em especial, a falta de resposta é um erro vital”.
Com uma população composta em 85% por emigrados –indianos, paquistaneses, filipinos e também latino-americanos- os Emirados são um importante consumidor de calçados e a China é o grande exportador não só para o país como para toda a região. O Brasil responde por residuais 0,57% de todas as importações de calçados do Oriente Médio e do Norte da África.
Segundo afirma Silvia Pierson, “obviamente, por múltiplas razões, não temos como competir com a China. Mas podemos nos inserir num espaço importante de mercado que se situa entre a China e a Itália. Talvez não tenhamos preço para uma inserção nesse mercado na dimensão do que é feito pela China, mas temos preço e qualidade para ocupar na região espaços equivalentes ao da Itália”.
A Itália conquistou seus espaços pelas inúmeras marcas de luxo, pelo design e boa parte das vendas nos Emirados têm como consumidor final os expatriados europeus, muitos deles executivos de multinacionais europeias e americanas e também os habitantes locais, que desfrutam de melhores condições socioeconômicas entre a população dos Emirados.
Apesar disso, a executiva acredita que “a Itália tem um nome no mercado, alicerçado durante décadas pela qualidade dos seus calçados, mas podemos fazer o mesmo em relação ao Brasil. Temos que construir a nossa imagem, a exemplo do que foi feito em relação aos produtos do agronegócio, para acharmos o nosso nicho nesse mercado. Não precisamos ser a China nem a Itália. Existe muita coisa entre a China e a Itália. Estou me referindo a um grande filão que não se restringe a essa região, mas se estende a diversos outros países nos quais temos mercados a explorar”.