Imagem, divulgação: Norcoast

Norcoast iniciará operações em janeiro apostando no futuro da cabotagem no Brasil

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Da Redação

Brasília – Até o final do próximo mês de janeiro de 2024, a Norcoast iniciará as atividades como operadora de cabotagem no país com um navio e até fevereiro outros três serão agregados à frota que atuará nos portos de Paranaguá, Santos, Pecém, Manaus e Suape, fazendo a rotação completa. A empresa nasceu de uma associação entre duas gigantes do transporte marítimo, a Hapag-Lloyd e a Norsul e será a quarta navegadora a operar no mercado da cabotagem brasileira.

Segundo Gustavo Paschoa, CEO da Norcoast, “em 2021, fizemos na Norsul um projeto voltado para a diversificação de negócios e identificamos a cabotagem de contêineres como uma grande oportunidade. Os estudos mostraram que o Brasil tem mais de 8,5 mil kms de costa e quase 23 mil kms de rios navegáveis e se fizermos um comparativo com países com costas tão grandes ou até maiores que a do nosso país, a participação da cabotagem na matriz de transporte desses países beira os 50%, enquanto no Brasil essa participação é inferior a 5%”.

O CEO da quarta e mais recente entrante na cabotagem brasileira destaca que “vimos ali uma grande oportunidade e demos início às conversações com a Hapag-Lloyd e com a Norsul. Identificamos uma necessidade muito grande de conexão no comércio internacional, pois os navios que estão chegando à costa brasileira têm aumentado de tamanho, passando de 10 mil TEUs, 11 mil TEUs (1 TEU equivale a um contêiner de 20 pés) para 14 mil TEUs e isso faz com que haja uma necessidade muito grande de conexão entre os principais portos, os chamados hubs portos, com os portos menores. Aí entra o conceito da cabotagem no transporte que chamamos de feeder, que é a conexão da exportação com a importação com os portos na costa brasileira”.

A joint venture que criou a Norcoast surgiu graças ao histórico que as duas empresas formadoras da iniciativa têm na economia brasileira, por acreditarem no Brasil e motivadas pela Lei de Incentivo à Cabotagem, conhecida como BR do Mar, que flexibilizou algumas barreiras de entrada no mercado e trouxe novas possibilidades para novos entrantes, como a Norcoast, de dar início às suas operações.

Gustavo Paschoa, CEO da Norcoast

“Começamos a empresa praticamente do zero e desde o início deste ano estamos concretizando o projeto, buscando as licenças, implementando processos e sistemas, contratando pessoas e tudo aquilo que diz respeito a começar uma empresa do zero. Uma empresa totalmente independente, apesar de os sócios contribuírem bastante não só com investimentos, mas estamos trazendo quatro navios hoje operados pela Hapag-Lloyd e que serão transformados em navios de bandeira brasileira. Eles começam a chegar no final deste ano e vão operar com 100% de tripulação brasileira para fomentar a indústria nacional e a navegação costeira brasileira. Com isso, trabalhamos com a perspectiva de uma participação muito grande no mercado”, afirmou Gustavo Paschoa.

Há 20 anos a navegação de cabotagem brasileira é operada por apenas três empresas e a Norcoast surge como a primeira nova entrante no segmento nessas duas décadas. Por isso, o CEO da companhia afirma que “a chegada da Norcoast é um marco muito importante para a logística nacional, para o comércio exterior e para a economia brasileira de uma maneira geral”.

Cabotagem trabalha com perspectiva de alta

No ano passado, o setor de cabotagem movimentou 1,2 milhão de TEUs e esse número deve se repetir em 2023. Para os próximos cinco ou seis anos, a projeção é de um crescimento expressivo, para 2 milhões de TEUs. E a Norcoast espera conquistar uma participação relevante desse mercado já no primeiro ano de operações, principalmente a partir do mês de março, quando os quatro navios já estarão realizando a rotação completa pelos quatro portos brasileiros.

A empresa dará início às suas atividades num momento em que o governo brasileiro aposta alto nessa modalidade de transporte de mercadorias. Ao participar recentemente do seminário “O crescimento da economia e a importância da cabotagem na matriz de transporte brasileira – perspectivas e desafios”- promovido por ocasião das comemorações dos 50 anos de criação da Associação Brasileira de Armadores de Cabotagem (Abac), o ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França, afirmou que a cabotagem e o transporte aquaviário são prioridades do governo e mencionou a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de recriar o ministério: “o presidente volta a dar importância aos setores que estavam embolados na Infraestrutura, onde os tema aquaviários, cabotagem, portos, aeroportos eram bem secundários e agora passarão a merecer a atenção devida”.

Entre as inúmeras vantagens agregadas pela cabotagem em comparação ao transporte por caminhão, responsável pela grande parcela de movimentação de cargas no país, o ministro destacou que “um único navio pode transportar o mesmo que 42 mil caminhões e emitir um quarto ou um quinto do total de CO2, os gases de efeito estufa. Temos a cabotagem como solução de transporte sustentável em segurança, saúde, eficiência, emprego, geração de renda e qualidade do meio ambiente”.

Na percepção de Gustavo Paschoa, “o nosso grande competidor não são as outras empresas de cabotagem. Basicamente é o caminhão, que está fazendo o transporte de contêineres de longo percurso. Um estudo feito em 2019 pelo ILOS, uma das mais conceituadas consultorias de logística e supply chain brasileiras, aponta que para cada dez contêineres que estão sendo transportados nas longas distâncias da costa brasileira, 4,7 deles poderiam estar se utilizando da cabotagem se houvesse mais capacidade dentro do sistema. E é exatamente isso que nós da Norcoast estaremos trazendo”.

Logística integrada

Para ocupar espaços potencialmente criados com um uso menor dos caminhões no transporte das cargas, a empresa explorar novos caminhos ao trabalhar com a logística integrada, que lhe permitirá buscar e entregar as cargas na porta dos clientes.

Conforme explica Gustavo Paschoa, “por ter essa característica de querer converter o caminhão para a cabotagem, temos pela frente um desafio que reside no fato de que o caminhão pega a carga do embarcador no ponto de origem e leva até o ponto de destino. Se fizermos a cabotagem pura, ou seja, porto a porto, não vamos ajudar os nossos embarcadores. Daí, a nossa ideia de integrar, de usar a multimodalidade para isso, tirando a mercadoria dos portos e levar até seu destino final, utilizando do próprio caminhão e ferrovias, conectando os armazéns de consolidação de carga, a própria atividade no terminal de transbordo no caso do feeder (que ocorre quando o navio oriundo de um porto concentrador de cargas (hub) distribui as cargas para outros portos, por questões de logística entre outros motivos). Existe uma necessidade do mercado e nos preparamos para supri-la lançando o nosso serviço com o intuito de trazer acesso ao cliente que não utiliza da cabotagem, mas que pode usar essa integração logística para acomodar dentro das suas cadeias de valor”.

Menos emissão de gases de efeito estufa

Em tempos marcados pelas profundas mudanças climáticas geradas pela crescente emissão de gases de efeito estufa, a navegação global -e nela se insere a cabotagem- tem um grande diferencial que está no fato de o setor responder por apenas 3% da emissão dos gases de efeito estufa, apesar de movimentar 80% do comércio internacional global.

No caso específico do Brasil, a Norcoast aponta vários outros benefícios, conforme sublinha o CEO da empresa: “a cabotagem emite quatro vezes menos que qualquer outro modal. Outro aspecto igualmente relevante está no fato de que ela traz uma segurança no transporte muito maior que o caminhão. Se levarmos em conta fatores como roubo de cargas ou qualquer outra sinistralidade, na navegação costeira são muito menores do que em qualquer outra modalidade de transporte. E quando se transporta por navios, e os navios da Norcoast são de 3,5 mil TEUS, para cada navio tiramos milhares de caminhões das rodovias, contribuindo para descongestioná-las e torná-las mais seguras. Tudo isso visto sob o prisma da sustentabilidade, a cabotagem traz grandes benefícios para os embarcadores e, sobretudo, para transformar a nossa economia numa economia limpa”.

Apesar da reconhecidamente baixa emissão dos gases de efeito estufa, reduzir ainda mais essas emissões é considerado um objetivo importante a ser perseguido pela empresa: “chegamos ao mercado trazendo as melhores práticas da Hapag-Lloyd e da Norsul. A Norsul já neutraliza todas as suas emissões, apesar de baixas, e vamos oferecer a neutralização para os nossos clientes. Para isso, estamos pesquisando novas tecnologias com motores duplo combustíveis, usando a tecnologia que é bastante usada aqui no Brasil, que é o etanol. Faremos tudo o que for necessário para diminuir a emissão desses navios e para isso vamos trazer essas melhores práticas e estaremos empenhados em contribuir para termos uma economia com zero emissão em 2050”.

Gustavo Paschoa vê na logística e na oferta dos combustíveis alternativos grandes obstáculos a serem transpostos para que o transporte marítimo possa usar as novas tecnologias em processo avançado de pesquisa.

Segundo ele, “o setor da navegação ainda não tem, como o automotivo, uma solução em termos de sustentabilidade. A navegação ainda está pesquisando as várias possibilidades existentes. Qual é hoje o grande problema dessas novas tecnologias? São a logística e a oferta desses combustíveis. Não adianta selecionarmos e ter a tecnologia para queimar esses combustíveis mais limpos nas nossas embarcações se não tivermos como abastecê-las. Existe um movimento do mercado, de toda a cadeia de valor da navegação para conseguir achar a melhor alternativa. Dentre as alternativas avaliadas figura o etanol, especificamente quando falamos do Brasil, mas ainda não encontramos uma alternativa para implantar no mercado.

Norcoast defende ESG com 4 letras

Após ressaltar que, assim como acontece na Halpag-Lloyd e na Norsul, também na Norcoast, a temática ESG figura em lugar de destaque no portfólio da Norcoast. Segundo o executivo, “esse é, sem dúvida, um tema bastante relevante e quando falamos das três letrinhas (ESG) costumo brincar dizendo que deveríamos acrescentar uma quarta, a letra E, de Economics (Economia), porque nada que a gente fala em relação ao ambiente, à sustentabilidade, às políticas de inclusão social, ou da própria governança das empresas, que podem ser resumidas nessas três letras, deveria deixar de levar em conta o lado financeiro, o lado econômico de tudo isso, porque a política ESG tem que ser algo sustentável no plano econômico. Mas, as empresas querem participar disso? Todas as empresas estão de fato se motivando a isso?”

Para o CEO da Norcoast, qualquer política a ser implementada terá um preço e para implementá-la na plenitude será necessário um esforço de toda a sociedade e esse esforço passa pela questão econômica: “a Norcoast nasceu como uma empresa que olha muito para essa questão da sustentabilidade, mas o faz sem desviar seu olhar voltado para a questão social. Vamos operar em portos, como por exemplo o de Manaus, onde a questão da sustentabilidade  é muito forte, porque vamos navegar no maior rio de água doce do planeta, estaremos ao lado da maior floresta tropical do mundo e por isso precisamos tomar muito cuidado com a questão da sustentabilidade”.

A questão social em um país com históricas e gritantes desigualdades será um outro forte componente na definição das estratégias de ação da empresa pois, segundo o executivo, “a gente carrega esse legado das empresas mães, tanto a Hapag-Lloyd quanto a Norsul, e, com certeza, vamos estar investindo, colocando o E de Economics para trabalhar visando desenvolver tanto a sustentabilidade quanto para contribuir com o desenvolvimento social nessas regiões”,

Presença chinesa na cabotagem brasileira

Ao ser perguntado se a China pode entrar no mercado da cabotagem brasileira, Gustavo Paschoa disse que “na verdade, a China já participa do mercado brasileiro de cabotagem. Se olharmos para o que está acontecendo, por exemplo no Canal de Panamá, afetado por uma crise que só tende a se agravar, isso faz com que as empresas busquem fazer as importações da China usando o que chamamos de transbordo. Ou seja, ao invés de as cargas virem através do Canal do Panamá e atingir Manaus, ou os portos do Nordeste, elas são levadas de Xanghai ou outros portos chineses para Paranaguá e ali se faz o transbordo para a cabotagem e com isso se atende aos portos do Nordeste. Essas operações de transbordo vêm se intensificando”.

Com relação ao forte e crescente intercâmbio comercial entre o Brasil e a China, e ante os temores de setores da indústria brasileira como os de calçados e têxteis, que a cada ano perdem mercados na América Latina e em outros continentes e postos de trabalhos pela concorrência com a agressiva indústria chinesa, Gustavo Paschoa acredita que “o Brasil precisa investir fortemente em tecnologias para manter competitividade e empregos, investir na educação, na saúde das pessoas. Alguns setores sofrem com as importações procedentes da China e isso requer uma questão de competitividade e investimentos em tecnologia e educação, porque só assim vamos manter nossos postos de trabalho e até criar empregos aqui no Brasil. Fácil não é, mas para tudo existe uma solução, que pode ser de curto, médio ou longo prazos, mas a solução existe”.

Ao falar sobre os desafios que tem pela frente como CEO da Norcoast, o executivo que chegou ao posto após uma sólida e exitosa carreira em empresas multinacionais de logística e transporte, desenvolvendo projetos de  multimobilidade nacional e internacionalmente, afirma que “o desafio é aquele inerente a uma empresa nova, uma nova entrante num mercado em que há mais de 20 anos não se vê uma nova participante, que é o de fazer com que a empresa inicie suas atividades de forma correta, cumprindo todas as regras e especificações do país em que está atuando, agradando aos seus clientes, entregando um serviço de excelência e inovador”.

Para ele, o exercício dessas funções é facilitado porque “sou apaixonado por aquilo que eu faço. Adoro logística. Adoro navegação. São atividades que transformam países. Acredito que essa paixão transforma, de fato, esse grande desafio, tornando-o bem mais fácil para mim porque essa paixão me dá forças e energias para fazer tudo isso que acabei de mencionar. É importante ajudar aos nossos clientes, aos nossos colaboradores, aos nossos acionistas, mas, sobretudo, ajudar o Brasil a se tornar um país desenvolvido”.

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