Lula anuncia a volta do país ao continente africano, durante o Fórum Econômico organizado pela ApexBrasil. “Nós voltamos para valer. Vamos voltar a fazer financiamento para os países africanos”, aposta. Agências de promoção de exportações dos dois países acreditam que a retomada da parceria vai assegurar bons negócios para ambas as nações. Angola é a porta de entrada para o país e o Brasil, a janela da África para o Mercosul
Da Redação (*)
Brasília – O Brasil está retomando sua parceria estratégica com Angola e o continente africano em busca de bons negócios e oportunidades de desenvolvimento para todos. Na sexta-feira, 25, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um apelo a empresários brasileiros e angolanos para que aprofundem as relações comerciais entre os dois países para melhorar a vida dos povos que vivem nos dois lados do Atlântico.
“Voltamos à África para dizer aos empresários brasileiros e aos angolanos que voltamos para valer. Vamos voltar a fazer financiamento para os países africanos”, disse. “Vamos voltar a fazer investimento para Angola, que é um bom pagador das coisas que o Brasil investiu aqui. Angola sempre foi um país que nos deu certeza de que cada dólar investido aqui seria ressarcido e assim o fez”.
Para uma plateia de 500 empresários de diversos setores da economia brasileira e angolana, que participaram do Fórum Econômico Angola Brasil, promovido pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) em Luanda, Lula disse que as duas nações têm muito a ganhar com a parceria. “Queremos que os empresários sejam alavancas para que a gente possa criar novos empregos”, declarou. Lula arrancou aplausos entusiasmados da audiência.
O presidente de Angola, João Lourenço, ofereceu o país como porta de entrada do Brasil na região austral e central do continente africano, e quer que o país sul-americano seja a porta para Angola entrar na região do Mercosul. “Hoje assinamos alguns instrumentos jurídicos de cooperação que vão tornar possível concretizarmos os programas e projetos que temos em comum”, declarou Lourenço, que chamou Lula de “irmão” do povo angolano. “Angola é feliz agora, meses após a investidura do presidente Lula, ao ser o primeiro país africano a receber uma visita do presidente do Brasil”, declarou.
“Vamos reforçar os nossos laços de cooperação, queremos desenvolver os domínios da agropecuária, da educação, saúde, turismo e outros que são importantes para ambas as nações, queremos ver o investimento brasileiro em Angola, mas também queremos ver investimento angolano no Brasil”, arrematou Lourenço.
Lula elogiou o presidente da ApexBrasil, Jorge Viana, por organizar o Fórum Econômico junto com a Agência de Investimento Privado e Promoção das Exportações de Angola (AIPEX). Disse que o evento é essencial para a retomada de um novo ambiente de negócios que possa ampliar a relação entre os dois países.
“Eventos como este é preciso a gente fazer muitas vezes, muitas vezes, porque as oportunidades não surgem todo dia. A gente tem que procurá-las. Vocês que são empresários, que são investidores, são empreendedores, sabem disso”, declarou.
O Fórum Econômico Angola-Brasil reuniu mais de 160 executivos brasileiros dos setores de alimentos, produtos farmacêuticos, aviação e máquinas agrícolas e cerca de 300 empresários angolanos. O evento tratou dos desafios e oportunidades de negócios nas áreas de segurança alimentar e agricultura, transição energética, infraestrutura, mineração, saúde, educação e desenvolvimento humano.
ApexBrasil projeta investimentos e negócios
Segundo Jorge Viana, Lula retoma as relações entre as duas nações e isso vai permitir mais investimentos e negócios. “A diplomacia presidencial é imprescindível, é ela que faz com que as coisas aconteçam e o Brasil, lamentavelmente, estava há alguns anos sem essa diplomacia e sem a presença do chefe de Estado vindo aqui, abraçando, defendendo os interesses do nosso país, mas defendendo os interesses do país irmão como é o caso de Angola, para que as coisas aconteçam. É isso que Lula veio fazer aqui”, disse.
O presidente da AIPEX, Lello Francisco, acredita que o momento é oportuno e abre-se agora um novo patamar na histórica relação entre as duas nações. “Este fórum é para nós, sem dúvida, uma plataforma que vai permitir a troca de experiências entre o empresariado dos dois países, desenvolver sinergias, para a captação de negócios”, destacou. Para Francisco, o evento contribui para que as empresas brasileiras aprofundem o conhecimento do mercado angolano e num futuro muito próximo invistam nas potencialidades da economia angolana.
Vasto potencial
Angola apresenta grandes potencialidades para o Brasil. O país tem uma população de 35,6 milhões de habitantes e um PIB de US$ 125,7 bilhões. O comércio exterior representa cerca de 50% do PIB de Angola. O país é membro de dois blocos comerciais: a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC, no acrônimo em inglês) e o Mercado Comum da África Oriental e Austral (COMESA, em inglês). Os dois blocos conferem acesso preferencial ao mercado angolano para 27 países africanos, que somaram 4% de market share em 2021 – grande parte, pela África do Sul.
Angola também ratificou o Acordo da Zona de Comércio Livre Continental Africana (AfCFTA, em inglês). Embora esteja em vigor para 46 países da União Africana, até abril de 2023, o acordo não possui um regime de livre comércio plenamente implementado. Mas essa zona de livre comércio continental africana reúne um mercado de 1,3 bilhão de pessoas e um PIB de US$ 3,4 trilhões de dólares. Portanto a África, que é o berço da humanidade, também é estratégica para o futuro da economia mundial.
Diplomacia do atraso
Todo este potencial ficou deixado de lado nos últimos sete anos, depois do impeachment da presidente Dilma Rousseff em 2016. Lula afirmou que lamentavelmente o Brasil tratou países africanos com indiferença nos últimos anos, citando o fechamento de embaixadas brasileiras. Em 2020, o ex-presidente Jair Bolsonaro encerrou as atividades das embaixadas do Brasil em Freetown (Serra Leoa) e Monróvia (Libéria), que passaram a funcionar de forma acumulada na embaixada em Acra (Gana).
“Pela primeira vez, desde a redemocratização, tivemos um presidente que não fez nenhuma visita à África. Embaixadas brasileiras foram fechadas, e a cooperação foi abandonada”, denunciou o líder brasileiro. Para Jorge Viana, essa diplomacia do atraso implementada pelo governo anterior foi ruim para o país. “O governo Bolsonaro apagou Angola. E ela é a porta do Brasil para a África”, disse.
Com a ida de Lula a Angola, os dois países retomaram duas frentes de grande impacto, fortalecendo a política de prevenção e diagnóstico e tratamento da hanseníase (doença infecciosa) no país africano. Lula e Lourenço anunciaram que Angola terá a primeira fábrica de medicamentos no país, resultado de um consórcio de três empresas brasileiras com a AIPEX. Com o início das operações previsto para 2025, a fábrica de medicamentos vai gerar 280 postos de trabalho, e permitirá ao país atender o mercado local e exportar para outros mercados.
Angola, polo de defesa na África
Na avaliação de Lula, Angola tem condições de tornar-se um pólo de defesa na África, com a aquisição de aeronaves, e a revitalização da frota de Tucanos e Super Tucanos, com transferência de tecnologia para o país. A Força Aérea Angolana também tem interesse em comprar quatro aviões KC-390, da Embraer. Cada aeronave hoje tem o custo de US$ 85 milhões.
O presidente brasileiro anunciou ainda que a indústria naval brasileira pode apoiar a modernização da Marinha de Guerra Angolana, acrescentando que os dois países abordaram a questão do financiamento de operações de exportação brasileira, fundamental para alavancar a parceria economia entre as nações. Além da área de defesa, os dois países têm uma cooperação estratégica e desenvolvem parcerias em diversas áreas, agricultura, saúde pública e educação.
“Este país tem ouro, este país tem petróleo, este país tem gás. E este país tem oportunidade. Esse país tem um potencial agrícola extraordinário”, elogiou o presidente brasileiro. “A gente vai ter que pensar nessas coisas para que a gente possa fazer o que a gente não fez no século passado. Nós não temos o direito de continuarmos pobres”.
Avanço dos BRICS
No discurso, Lula voltou a destacar o avanço dos BRICS — o grupo de países formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul —, depois da reunião de cúpula realizada em Joanesburgo durante dois dias, 23 e 24 de agosto. E o novo momento que a geopolítica brasileira vai viver. “Trouxemos a Arábia Saudita, os Emirados Árabes, o Egito, o Irã, a Argentina, e a Etiópia”.
Ele ressaltou que o mundo agora é outro. “Nós, o Brasil e a África, há 20 anos atrás éramos chamados de países de Terceiro Mundo. Depois de muito tempo, nós passamos a ser chamados de países em vias de desenvolvimento”, lembrou. “Agora, não somos mais chamados de terceiro mundo, somos chamados de Sul Global”. Lula ressaltou que o PIB de paridade de compra entre os países que compõem o BRICS e o G7 — o grupo dos sete países mais ricos do mundo — mudou. O PIB dos BRICS agora é muito maior.
“Em 1995, o G7 tinha 45% do PIB de paridade de compra no mundo. Os países que compõem os BRICS, sem os novos que entraram, representavam apenas 16.9%. Ou seja, era 45% contra 17%. Em 2010, o G7 já tinha caído para 34,3% do PIB de paridade”, comparou Lula, citando os números. “Os BRICS tinham chegado a 26,6%. Em 2023, o G7 representa 29,9% do PIB de paridade. E os BRICS representam 32,1%. Agora, com a entrada desses países que eu falei, nós passamos para quase 37% do PIB de paridade. Demonstra o quê? Demonstra, pura e simplesmente, que os países do Sul resolveram se organizar”.
Lula convidou o presidente angolano para participar das reuniões do G20 durante a Presidência do Brasil no bloco, que terá início em dezembro deste ano. “Quero aproveitar para convidar o companheiro João Lourenço para participar da reunião do G20. Iremos realizar a próxima reunião do G20, depois da Índia, no Rio de Janeiro, possivelmente em setembro de 2024. Portanto, já está convidado publicamente”, anunciou.
Prioridade à África para combater avanço da China
Durante seu discurso no Fórum Econômico realizado pela ApexBrasil e APIEX, Lula disse novamente que os erros do governo passado serão corrigidos com a reaproximação entre os dois países. “A China começa a investir na África, a Índia começou a fazer investimentos em países africanos. A Turquia começou a fazer investimento no continente africano e o Brasil se afastou”, lamentou.
A visita de Lula a Angola mostra a volta de uma política externa que vai dar prioridade ao continente africano e aos vizinhos da América do Sul. “Quem é que tem maior capacidade de produzir energia renovável como nós? Como o tal do Sul Global? Quem é que tem a capacidade de produzir energia eólica, energia solar, bioetanol, biodiesel, hidrogênio verde? Qual é o país que tem a mesma capacidade que têm os países do continente africano e da América do Sul?”, questionou, apontando os rumos do potencial de negócios a empresários angolanos e brasileiros. “É disso que nós temos que saber tirar proveito”, insistiu Lula.
Ao encerrar seu discurso no Fórum Econômico Angola Brasil, o presidente brasileiro apontou que sabe o potencial que a relação entre os dois países têm pela frente. Uma oportunidade para os dois povos.
“O que é importante é a gente ter um projeto, e o nosso projeto agora é de fazer com que o Sul Global se coloque em pé de igualdade com o norte do mundo. Nós não queremos tirar nada de ninguém, apenas ser tratados em igualdade de condições e ter as mesmas oportunidades”, ressaltou.
E finalizou: “Quero agradecer a vocês, quero agradecer de coração a cada empresário brasileiro, a cada empresário angolano, e dizer para vocês: esse mundo será o que a gente quiser que ele seja. Angola será o que vocês quiserem que o país seja. E o Brasil será aquilo que nós quisermos que ele seja. Muito obrigado”.
(*) Com informações da Agência Brasil