Antagonismo e temor marcam última semana da corrida eleitoral na Argentina

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Regiane Nitsch Bressan (*)

Em uma semana agitada no cenário político argentino, os candidatos Sergio Massa (União pela Pátria) e Javier Milei (A Liberdade Avança) encerraram suas campanhas para o segundo turno em um clima eleitoral tenso, provocado pelo temor e acusações. Nestes dias prévios ao segundo turno, a campanhas foram regadas de alegações de fraude, acusações diretas e desconfianças mútuas. Os dois candidatos encerraram seus discursos com mensagens distintas, mas intentando conquistar votos dos indecisos e daqueles avessos a ambos.

A campanha de Milei pautou-se em alegações anônimas de que a polícia civil argentina teria adulterado urnas no primeiro turno. Isso levou seu partido a solicitar reforço da presença das Forças Aéreas e Militares para “evitar” repetição do suposto incidente neste domingo, 19 de novembro. O governo rejeitou veementemente o pedido de A Liberdade Avança.

Massa encerrou sua campanha visando conquistar o voto jovem em tom de esperança à continuidade de políticas sociais, uma de suas principais bandeiras. Ele também enfatizou a necessidade de os argentinos voltarem a confiar na política tradicional, a qual enfrenta total descrédito. Por sua vez, Milei liderou um ato em Córdoba diante à presença de Patrícia Bullrich, a terceira colocada, a qual candidata da classe conservadora tradicional do país.

Ao catalisar os votos de Bullrich, o ultradireitista Milei reforçou sua confiança, pedindo coragem ao triunfo de mudanças baseadas em medidas econômicas radicais, que salvariam o país da atual crise econômica avassaladora. Evitando mencionar o nome do oponente, Massa criticou amplamente suas propostas econômicas, tidas como inconsistentes e incoerentes. Ele também defendeu a educação pública e gratuita, bem como novas medidas para combater inflação e atrair investimentos estrangeiros.

Após o debate político de 12 de novembro, quando Massa apresentou melhor desempenho, encurralando Milei e pautando o debate, houve certa inversão nas pesquisas eleitorais. Aliás, os prognósticos são incertos sobre o resultado eleitoral, havendo um nível de tensão sociopolítica sem precedentes. O cenário, inicialmente polarizado entre medo e raiva, evoluiu para um embate entre diferentes formas de medo. A atmosfera política argentina está carregada de violência contida, manifestações provocadoras e um clima de crispação inédito, tornando até a distribuição de panfletos um ato audacioso em alguns lugares.

A campanha, inicialmente centrada em questões políticas, transformou-se em um embate marcado pelo medo, seja este associado às propostas libertárias que desafiam acordos democráticos ou à preocupação com uma possível autocracia representada pelo candidato opositor. As expressões agressivas dos líderes políticos exacerbaram as tensões e a polarização se reflete não apenas na esfera política, mas também na sociedade em geral. O clima de antagonismo, agora mais arraigado na base social do que na estrutura política, representa um perigo à estabilidade democrática, tão sensível na América Latina.

À medida que se aproxima o dia da eleição, aumentam as preocupações sobre a transparência do processo, com acusações de possíveis fraudes e a necessidade de medidas adicionais para evitar incidentes durante a votação. O otimismo transmitido pelos libertários contrasta com a cautela do oficialismo, que expressa receios sobre o aparato estatal e a capacidade de resposta às demandas sociais. O resultado eleitoral é visto não apenas como a escolha entre dois candidatos, mas como uma disputa pelos valores fundamentais da pátria, democracia, liberdade e direitos adquiridos.

(*) Regiane Nitsch Bressan é professora do curso de Relações Internacionais da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios da Universidade Federal de São Paulo (EPPEN/Unifesp); professora do Programa Interinstitucional (Unesp, Unicamp e PUC-SP) de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas; também é doutora e mestre em Integração da América Latina pela USP e integra o Observatório de Regionalismo, GRIDALE, FOMERCO e CRIES.

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