A paulistana Helena Leite Rodrigues Fernandes fez trabalho de conclusão de MBA na USP sobre as oportunidades de aplicação da tecnologia do blockchain na relação do Brasil com os países árabes. Plataforma da Câmara Árabe foi estudada.
São Paulo – De um lado, o blockchain e suas imensas possibilidades de aplicação. De outro, a relação comercial do Brasil com os países árabes e seu potencial de crescimento. Unir esses dois universos e verificar como o primeiro está beneficiando e pode fazer avançar ainda mais o segundo foi objeto de estudo de uma aluna da pós-graduação da Universidade de São Paulo (USP), a paulistana Helena Leite Rodrigues Fernandesa), de 23 anos.
Helena entregou no começo deste mês o trabalho de conclusão do MBA em Digital Business da unidade Esalq, da USP, com o tema “Tecnologia Blockchain: oportunidades de aplicabilidade nas relações comerciais entre o Brasil e os Países Árabes”. O trabalho ganhou nota máxima e os professores que acompanharam apresentação da pesquisa sinalizaram que o material ficará na Biblioteca da USP como referência no assunto.
A história da paulistana com a tecnologia começou na Câmara de Comércio Árabe Brasileira, onde ela trabalha e é responsável há quatro anos pelo sistema de gestão de relacionamento com o cliente. Apesar de graduada em Marketing, a partir da experiência com o software, a jovem quis se aprofundar em tecnologia e se interessou por blockchain. “Eu gosto de estudar e falei: vamos ver o que tem no mercado de tecnologia além do CRM (Customer Relationship Management). Descobri que tem várias coisas bem legais”, diz.
Helena começou a estudar blockchain inicialmente de forma autodidata, se baseando principalmente em conteúdos em inglês, já que encontrou poucas informações existentes sobre o assunto em português. Também passou a frequentar eventos e workshops sobre blockchain. Quando foi procurar por um MBA para fazer, em 2020, no entanto, não achou cursos voltados especificamente ao assunto, mas acreditou que o Digital Business da USP era um bom caminho para unir blockchain e negócios, o que ela pretendia estudar.
O interesse pela tecnologia a levou não apenas a uma pós-graduação na área, como a migrar de setor no emprego. Na Câmara Árabe há sete anos, onde entrou como menor aprendiz, Helena trafegou entre as áreas Comercial e de Marketing, mas desde o início deste ano está no Departamento de Tecnologia da Informação (TI), em que tem o cargo de Product Owner e dá apoio a um projeto de blockchain, entre outras atividades.
A Câmara Árabe possui uma plataforma chamada Ellos, da qual faz parte o Easy Trade, ferramenta que usa blockchain para operar de forma digital o despacho aduaneiro do comércio do Brasil com os países árabes, dispensando o papel. A solução já é usada na exportação do Brasil à Jordânia e deve passar em breve a ser utilizada por outros países árabes. O Easy Trade da plataforma Ellos foi o caso estudado por Helena no MBA.
“O blockchain é tão customizável, é tão manipulável que você pode aplicá-la em determinados setores conforme demandas muito específicas. Ele provém vários benefícios, é seguro, é transparente, é rastreável e escalável. Essas características acompanham o blockchain independentemente da aplicação. Eu posso usar no setor financeiro, eu posso usar em supply chain, eu posso usar em N lugares, ela continua sendo segura, transparente, rastreável e escalável”, afirma.
Com base na experiência com a plataforma Ellos, o trabalho apontou o benefício do uso da tecnologia de blockchain no comércio do Brasil com os países árabes, além dos desafios ainda existentes e das novas oportunidades de aplicação. O estudo parte de uma visão geral sobre a tecnologia de blockchain, sobre a relação comercial Brasil-países árabes e os seus potenciais. “Brasil e países árabes são parceiros muito importantes, têm potencial gigantesco, blockchain também tem potencial gigantesco”, afirma Helena.
A acadêmica fez entrevistas com profissionais de diferentes áreas da Câmara Árabe sobre a aplicabilidade e os benefícios vistos na plataforma Ellos e seu blockchain. Profissionais de Relações Internacionais da instituição perceberam como benesse, por exemplo, a sustentabilidade do processo, ao usar documento digital em vez de papel, deixando de fazer o envio físico, o que geraria emissão de poluentes no transporte.
Em Inteligência de Mercado foram apontados a rastreabilidade e segurança da tecnologia, trazendo mais acurácia e transparência aos dados de exportação, inclusive para criação de políticas públicas visando o estreitamento da relação entre os países.
A área Comercial vê a economia de custo com o não envio de documento físico, propiciando até mesmo oferecer um produto mais competitivo ao mercado internacional. Também foi apontado como benefício o encurtamento de prazos, de 15 dias, para quatro horas, o que pode impactar as margens do negócio.
Uma nova aplicabilidade sugerida para o blockchain na relação comercial Brasil-países árabes e apontada na pesquisa foi a rastreabilidade que se pode fazer a partir de uma plataforma com essa tecnologia, principalmente para produtos halal. As mercadorias halal são produzidas segundo exigências do Islã e devem seguir uma série de padrões e procedimentos. O blockchain poderia rastrear todo esse processo e disponibilizar as informações ao consumidor.
Um dos desafios apontados foi a infraestrutura, já que para o blockchain funcionar é preciso internet e nem todos os países dispõem de rede conforme necessário. “Mas se for implantado algum projeto, você consegue ajudar esses países a terem essa parte básica de infraestrutura”, diz Helena. Outros desafios são dispor de profissionais qualificados em blockchain – que são escassos – e o custo, esse muito atrelado ao valor da mão de obra.
“Não há muitos profissionais qualificados e esse mercado está aquecendo, então o custo fica alto”, afirma Helena. Já outras despesas do blockchain, como armazenamento na nuvem e hospedagem no servidor, não costumam ser caros.
Com o MBA e a experiência adquirida, Helena se posiciona como uma profissional que propõe ou conduz projetos de negócios que utilizam blockchain e consegue planejar minimamente uma arquitetura para eles, mas em uma etapa prévia a um escopo técnico. Ela faz questão de explicar que não é desenvolvedora, portanto, não é a profissional que tem habilidades para criar uma plataforma de blockchain do ponto de vista tecnológico.
O trabalho de conclusão “Tecnologia Blockchain: oportunidades de aplicabilidade nas relações comerciais entre o Brasil e os Países Árabes” foi orientado pelo professor Bruno Henrique Sanches e deve estar disponível na Biblioteca da USP em breve para consulta pública. Ele dará origem a artigo científico para congresso ou revista.
(*) Com informações da ANBA